"A única revolução que se faria no Brasil
seria o enxugamento de um Estado que come a nação, com gastos crescentes,
inchado de privilégios e clientelismo, um Estado que só tem para investir 1,5
do PIB. A única revolução seria administrativa, apontada na educação em massa,
nas reformas institucionais, já que, graças a Deus, a macroeconomia foi herdada
do FHC e o Lula teve a esperteza de mantê-la, graças ao Palocci, que salvou o
País."
"Só um choque de livre empreendimento pode
mudar o Brasil. Mas esta evidencia é vista com pavor. Como aceitar o óbvio, que
o Estado, nas últimas décadas, congestionado, moribundo, só tem impedido o
crescimento? Isso vai contra os velhos dogmas dos intelectuais..."
Por Arnaldo Jabor (Estadão)
O tempo atual é Renascença ou Idade Média? Os
acontecimentos estão inexplicáveis, pois a barbárie das coisas invadiu o mundo
dos homens. Temos um acesso a informação infinita, mas nada se fecha em
conclusões coerentes, nada acaba, nada se define.
O socialismo não deu certo, o
capitalismo global não trouxe paz nem progresso, tudo que depende da vontade
dos homens e de seus sonhos de controle, não chega a um final feliz. As coisas
têm vida própria e seus criadores não controlam mais os produtos. O mundo é cada
vez mais uma tumultuosa marcha de fatos sem causa, de acontecimentos sem
origem. Cada vez temos mais ciência e menos entendimento. As teorias não deram
certo e percebemos hoje que Kafka e escritores do início do século 20, como
Mann, Musil, depois Beckett e Camus sacaram o lance. Esperando Godot é
mais profundo e profético que 100 anos de ilusões políticas.
Hoje, viramos objetos de um "sujeito"
imenso, sem nome, sem olho, misterioso, que talvez só entendamos depois do
tempo esgotado, quando for tarde demais. Essa é a sensação dominante.
Por que estou com essas angústias filosóficas hoje?
Bem... porque no Brasil também estamos diante do dilema: Renascença ou Idade
Média, progresso ou regresso?
A rapidez do mundo atual, para o bem e mal, nos
deixa para trás. Vivemos uma modernidade veloz e falamos discursos antigos. As
ideias não correspondem mais aos fatos, como cantou Cazuza.
Hoje as palavras que eram muros de arrimo foram
esvaziadas de sentido. Uma palavra que era pau para toda obra:
"futuro". Que quer dizer? Antes, 'futuro' era um lugar onde
chegaríamos um dia, que nos redimiria de nossos sofrimentos no presente. Agora
o termo 'futuro' tem uma conotação incessante, como se já estivéssemos nele.
Estamos com saudades do presente, que nos escapa como um passado. O presente se
esvai e o futuro não para de 'não' chegar.
Outra palavra: "Felicidade." Ser feliz
hoje é excluir o mundo em torno. Ser feliz é uma vivência pelo avesso, pelo
"não". Ser feliz é não ver, não pensar, é não se deixar impressionar
pelas desgraças do País ou dos outros.
Outra: "Miséria." A miséria sempre nos
foi útil. Diante dela tínhamos a vantagem, a riqueza da "compaixão".
Era doce sentir pena dos infelizes. Hoje, diante das soluções impossíveis,
temos uma espécie de raiva, de irritação nobre, bem 'ancien regime' contra os
desgraçados. Ficamos humilhados diante da impotência de soluções. O pobre virou
um 'estraga-prazeres'. E os nomes?
Que nome daremos ao desejo de extermínio que brota
nos cérebros reacionários? Exterminar bandidos - e excluídos também?
E que nome daremos à paralisia da política
brasileira, ao imobilismo das reformas, o absurdo desinteresse pelos dramas do
País? Que nome daremos ao ânimo do atraso, à alma de nossa estupidez? Que
medula, que linfa ancestral energiza os donos do poder do atraso, que visgo
brasileiro é esse que gruda no chão os empatadores do progresso e da
modernização? Vivemos sob uma pasta feita de egoísmo, preguiça, escravismo
colonial. Que nome dar a essa gosma que somos?
Que nome dar às taras de nossos intelectuais
incompetentes? São dois tipos básicos que surgem: o gênio inútil e o
neocretino. O gênio inútil sabe tudo e não faz nada. O neoidiota tem certezas
sem saber nada.
E que nome daremos a esse bucho informe que a
miséria está criando nas periferias?
Como chamar esta nova língua, este novo
"bem" dentro do "mal"? Não é mais "proletariado"
ou "excluídos" apenas. Surge uma razão dentro da loucura. Parece um
país paralelo esfarrapado, com cultura própria, com uma ética produzida pela
fome e ignorância.
E na política? Quem somos, o que somos?
Neoliberais, velhos radicais, neoconservadores, progressistas reacionários,
direita de esquerda ou, hoje no poder, 'esquerdismo de direita'?
E a palavra chave de hoje: 'democracia.' Que é
isso? Que quer dizer? No Brasil, democracia é lida como tolerância, esculacho,
zona geral. Democracia, que é o único sistema 'revolucionário' a que devemos
aspirar, é a melhor maneira de espatifar o entulho arcaico, corrupto,
patrimonialista que o Estado abriga. A única revolução que se faria no Brasil
seria o enxugamento de um Estado que come a nação, com gastos crescentes,
inchado de privilégios e clientelismo, um Estado que só tem para investir 1,5
do PIB. A única revolução seria administrativa, apontada na educação em massa,
nas reformas institucionais, já que, graças a Deus, a macroeconomia foi herdada
do FHC e o Lula teve a esperteza de mantê-la, graças ao Palocci, que salvou o
País.
Só um choque de livre empreendimento pode mudar o
Brasil. Mas esta evidencia é vista com pavor. Como aceitar o óbvio, que o
Estado, nas últimas décadas, congestionado, moribundo, só tem impedido o
crescimento? Isso vai contra os velhos dogmas dos intelectuais... A maioria dos
críticos sociais e culturais prefere morrer a rever posições. O recente caso do
Paraguai é vergonhoso. Protestam pelo 'golpe', como se o Lugo fosse um grande
líder, quando todo mundo sabe que era uma espécie de Berlusconi tropical;
ignoram o fato de que a Constituição deles previa um 'impeachment' como esse e
abrem caminho para que o fascista Chávez comece a provocar o Mercosul junto com
a espantosa Cristina Botox que está destruindo a Argentina. Como perguntou
alguém outro dia: 'Quando nossos intelectuais de esquerda vão denunciar pelo
menos a Coreia do Norte?'
A verdade é que para eles a democracia parece lenta
e ineficaz. Como disse o Bobbio: O ódio à democracia une a esquerda e direita.
Querem um autoritarismo rápido, que mude "tudo isso que está aí".
Esse episódio do Paraguai, que a presidente Dilma visivelmente teve de aderir
de má vontade, por imposição dos 'cucarachas' fascistas, aponta para uma
restauração da velha febre anti-imperialista que justifica e absolve a
incompetência da América Latina. E tudo isso apoiado por picaretas neomarxistas
como o showman Slavoj Zizek e alguns babacas daqui.
A América Latina está com fome de autoritarismo,
que é bem mais legível para os paranoicos
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