Por Marcel van Hattem*
A UFRGS decidiu em 2007 adotar cotas no vestibular. O problema do acesso ao nível superior não está, porém, ali, mas no vexaminoso ensino público brasileiro de base, retardatário nos índices mundiais. Não é novidade: desde muito antes das cotas e até hoje, a educação não deu sinal de melhoras. Além disso, como fazem cotas raciais, diferenciar uma pessoa pela cor da pele é discriminação em qualquer dicionário.
Muitos
defensores das cotas na UFRGS, porém, sempre foram fãs de métodos pouco
ortodoxos, quase nunca civilizados. Estudantes contrários, quando tinham a
chance de falar, eram obstruídos. Argumentar era falar com as paredes. Até um
corredor polonês foi feito por militantes do DCE no dia da votação do Conselho
Universitário. Os “manifestantes” gritavam palavras de ordem nos ouvidos dos
conselheiros que tentavam passar, fossem alunos, professores ou servidores. Com
direito a pressão política de senador e ministro presentes, as cotas passaram.
A
decisão definia que ocorreria uma avaliação em cinco anos. Agora, portanto. O
que se nota no debate em 2012, porém, é o mesmo não debate de 2007: urros,
corredores poloneses, bandeiras comunistas e até Che Guevara e Zumbi dos
Palmares invocados na defesa da manutenção e também da ampliação das cotas.
Ignoremos, por ora, a contradição com o argumento anterior de que seriam uma
mera medida paliativa, temporária, limitada. O que choca mais é a
impossibilidade de qualquer debate racional em tal circunstância.
Quando
chegava à reunião do Consun para debater o tema, na manhã de sexta-feira, Renan
Artur Pretto postou no Facebook: “Comecei bem a manhã: tomando chutes de
manifestantes antidemocráticos que fazem corredor polonês na porta de acesso à
reitoria”. Renan é um estudante não ligado ao DCE; já os “manifestantes” não só
o são como postaram orgulhosamente fotos da ação. Por que essa reação
truculenta se Renan queria, como representante de estudantes de oposição ao
DCE, apenas expressar seu pensamento com palavras?
Intolerância,
infelizmente, pode matar. E não leva a lugar nenhum em tempos de democracia e
liberdade de expressão – mas se acompanhada de violência deveria levar ao menos
à delegacia. Em um ambiente tumultuado, em que chutes e pontapés passam por
“manifestação de estudantes”, como esperar que se chegue a uma decisão
democrática e racional? Que ao menos nos ouçam as paredes.
*Mestrando
em Ciência Política (Leiden, Holanda) e ex-membro do Conselho Universitário
(Consun) da UFRGS, onde se formou em Relações Internacionais
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