segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Obsessão por censura. Nenhum dano decorrente da liberdade de imprensa é maior que os que ela ajuda a evitar


A imprensa é um termômetro: mostra a febre, mas não a cria, nem a cura. Xingá-la, no entanto, tornou-se parte de um curioso processo de catarse, que só convence a quem dele carece.

Por Senadora Katia Abreu (Folha de SP)

Nada conspira mais contra a democracia que a relativização de seus valores -entre eles (e sobretudo), a liberdade de imprensa. A tentativa de submeter os veículos de comunicação a um “controle social” é uma forma oblíqua de censura, com o indisfarçável propósito de mantê-la subjugada politicamente.

No Brasil, esse controle é ainda uma proposta obsessiva de parte expressiva do PT. Na Argentina, na Venezuela e no Equador, países que se consideram democráticos, é uma trágica realidade.

A uniformidade dos discursos preocupa, sobretudo quando se sabe que obedece a uma articulação continental entre grupos políticos hegemônicos que postulam um mesmo projeto: uma América do Sul socialista.

Os resultados têm sido nefastos para a imprensa e para a democracia. Em face disso, no fim do mês passado, empresários de rádio e televisão de diversos países sul-americanos, reunidos na 42ª Assembleia-Geral da Associação Internacional de Radiodifusão (AIR), em Montevidéu, aprovaram o envio de missão especial à Argentina, no dia 7 do mês que vem, para acompanhar a entrada em vigor, naquele país, da nova Lei de Meios.

Essa lei, com pequenas variantes, já havia sido tentada aqui, quando da edição do 3º Plano Nacional de Direitos Humanos, há quatro anos, felizmente repelida pela presidente Dilma Rousseff ainda quando candidata.

Todas as tentativas de enquadramento da imprensa, ao longo da história -e não foram poucas-, resultaram numa mesma constatação: não é possível fazê-lo sem ferir o princípio básico da democracia, que é a liberdade de informação e expressão.

O único controle democrático sobre a mídia é o que está na lei, mais especificamente no Código Penal. Os crimes decorrentes de seu uso indevido são três: injúria, calúnia e difamação, já devidamente capitulados, e geram reparações que, no limite, podem levar o infrator a sair do mercado.

Liberdade, como é óbvio, não exclui responsabilidade penal para quem dela abusa. Mesmo assim, os que reclamam da imprensa o fazem como se não estivesse submetida a limites legais, o que tornaria indispensável providenciá-los. É esse, em síntese, o teor sofístico das sucessivas conferências de imprensa do PT.

A imprensa é um termômetro: mostra a febre, mas não a cria, nem a cura. Xingá-la, no entanto, tornou-se parte de um curioso processo de catarse, que só convence a quem dele carece.

O ex-presidente Lula mantém relações esquizofrênicas com o tema. Já reconheceu diversas vezes que deve sua projeção política à imprensa, que, ainda ao tempo do regime militar, o acolheu com entusiasmo, como liderança popular emergente, arrostando riscos.

Mas diz que os jornais lhe dão azia, que o combatem injustamente e coisas afins, esquecido de que essas críticas convivem lado a lado, e em franca desvantagem numérica, com os que o louvam. Não há uníssono na imprensa.

A propósito, é improvável que haja um segmento da sociedade brasileira tratado com mais severidade -e frequentemente com injustiça- que o dos produtores rurais, em regra apresentados como vilões e retrógrados.

Não obstante, não se registra uma única declaração de suas instituições reclamando da imprensa ou pedindo restrição ao seu livre exercício. Nossa opção é democrática: o debate, o exercício do contraditório.

Hoje, com a internet, não há notícia que escape de divulgação. Se houver alguma informação alvo de sabotagem generalizada na mídia convencional -algo altamente improvável-, acabará vazando pela internet e chegando ao público.

Outra lenda: o monopólio das TVs, ponto central e recorrente dos questionamentos.

Há, no Brasil, em pleno funcionamento, nada menos que cinco redes nacionais privadas (Globo, Record, SBT, Bandeirantes e Rede TV!), além de emissoras educativas estatais e redes regionais, sem contar as TVs por assinatura.

Não há monopólio. Há liderança, que só pode ser quebrada mediante opção do telespectador.

Qualquer outra medida implica censura. Uma coisa é certa: nenhum dano decorrente da liberdade de imprensa é maior que os que ela ajuda a evitar.

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