sexta-feira, 22 de junho de 2012

O fim de uma era (David Coimbra)


Mas Maluf continua sendo tudo o que foi. E está junto com Lula e o PT, junto com o operário-presidente e o partido que cresceu com a aura de pureza. Claro, o PT foi mudando de lá para cá. Vimos, inclusive, Lula comovido ao pé da cama de Sarney. Mas agora é diferente. Agora o ciclo se encerrou.

Lembro do Brizola, em um dos primeiros debates eleitorais de 1989, altercando com Maluf.

– Filhote da ditadura! – esbravejava. E, apontando para a plateia, que fazia claque para o adversário: – Malufistas! Engordaram com a ditadura! Malufistas!

Esse “malufistas”, bom esclarecer, era xingamento.

Apesar de tamanha veemência, na época os petistas criticavam Brizola porque ele “fazia aliança com qualquer um” a fim de alçar-se ao poder. De fato, em 1986 Brizola levou seu partido a uma união eleitoral com Nelson Marchezan, que havia sido o principal líder político do general-presidente João Figueiredo. Depois, para construir os Cieps no Rio, Brizola postou-se ao lado do então presidente Collor, que começava a cair em desgraça, como caiu.

Os petistas não o perdoaram. Diziam que suas práticas eram antigas, populistas, demagogas. Na verdade, para os petistas, todos os outros partidos e candidatos de 89, se não eram sucedâneos da ditadura, estavam carcomidos por velhos defeitos: Ulysses era conservador, Covas não passava de um reformador, Roberto Freire, imagine, militava no ultrapassado Partido Comunista. Já, do PT, emanava pureza. Podia não ter projeto para o país, podia ser sectário, podia ser até antidemocrático, mas era puro.

Corta.

Agora, passados 23 anos, Lula e Maluf se abraçam e se aliam, sorridentes. Trata-se de um momento histórico. É como se o círculo político brasileiro, aberto em 1989, se fechasse. Como se as pontas se unissem. É o encerramento de uma era.

É preciso compreender o que simboliza essa união. Não estamos testemunhando uma aliança de conveniência convencional. Não. Já naquela época, Maluf significava tudo de que o Brasil queria se livrar no novo tempo. Maluf era o arenista típico, o representante civil do regime militar. Maluf era uma espécie de novo Adhemar de Barros, que se orgulhava de “roubar, mas fazer”. Maluf era o oligarca paulista genuíno, o subproduto da política de “deixar crescer o bolo para depois repartir”. Maluf era, enfim, o “filhote da ditadura”, como bem acusava Brizola.

As pessoas se esqueceram um pouco de tudo isso. Restou, sobre Maluf, “apenas” as acusações de corrupção que o tornaram, inclusive, um homem procurado pela Interpol. Mas Maluf continua sendo tudo o que foi. E está junto com Lula e o PT, junto com o operário-presidente e o partido que cresceu com a aura de pureza. Claro, o PT foi mudando de lá para cá. Vimos, inclusive, Lula comovido ao pé da cama de Sarney. Mas agora é diferente. Agora o ciclo se encerrou.

Esse casamento diz muito a todos nós. Diz que as coisas são assim mesmo. Que, não adianta o que se faça, nada vai mudar. Diz que temos de nos conformar. Que, mesmo que alguém seja bem-intencionado, terá de ceder, se quiser vencer. Esse casamento, mais do que dizer, grita que Maluf venceu. E que Adhemar estava certo: o melhor que podemos esperar é que roubem, mas pelo menos façam.

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