As “trajetórias de lutas”, sejam quais forem elas, não podem servir como salvo-conduto a más condutas escoradas na ilicitude.
Por DORA KRAMER
Liquidada a questão na Justiça, resta a José Dirceu e José Genoino tentar equilibrar as coisas no campo político.
O instrumento é o mesmo ao qual eles vêm recorrendo há algum tempo: a confrontação de suas trajetórias de vida com os votos condenatórios no Supremo Tribunal Federal, a fim de criar uma atmosfera de cruel linchamento.
O PT inclusive prepara um desagravo público a ser realizado após o fim do julgamento do mensalão, com a finalidade de deixar consignado que político com “história” não pode ser tratado como um molambo qualquer.
Faz sentido? Depende de como se vê a cena. Se o princípio é o de que os fins justificam quaisquer meios, até faz.
O partido continuará insistindo na história dos “erros pontuais” cometidos em nome de um projeto em prol da justiça social, jurando que não houve desejo deliberado de obter vantagens pessoais indevidas.
O PT se vê de forma muito diferente daquela com que enxerga a constelação de “vendidos” que cooptou para formar maioria: nada fez de má-fé. Agiu por ideologia nas melhores das boas intenções. Injusta, portanto, punição tão pesada.
Mas há outra maneira de olhar que subtrai todo e qualquer cabimento da ideia de uma absolvição virtual dando os mesmos pesos e medidas aos bons propósitos e aos atos nefastos.
Nem com muito esforço de boa vontade é possível esperar que daí resulte algum equilíbrio.
Por um motivo muito claro e simples: as “trajetórias de lutas”, sejam quais forem elas, não podem servir como salvo-conduto a más condutas escoradas na ilicitude.
Argumenta-se, para lamentar as condenações, que José Dirceu e José Genoino são homens com “história”. Verdade incontestável, ninguém discute esse ponto. Neles, aliás, reside a grande incoerência.
Políticos donos de substancioso histórico têm a obrigação de se comportar melhor que os demais – os desprovidos de semelhante bagagem. Pela lógica seria inerente a seres tão especiais a sensibilidade para distinguir entre o que está dentro ou fora dos marcos da legalidade.
Não uma qualidade, mas um dever de militantes forjados na ideologia. De valdemares e companhia espera-se qualquer coisa, mas do PT o País esperava maior apreço pelo ofício.
Condenados Dirceu e Genoino, o PT pode até se sentir injustiçado. Mas não pode dizer que a cigana o enganou. Sabia onde pisava quando optou por comprar facilidades.
Se o partido imaginou que a cobrança da conta não era uma possibilidade, só lhe resta lamentar ter caído na armadilha preparada pelo autoengano.
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