A falência do Estado de bem-estar social, especialmente dos modelos vigentes na Europa, acende uma luz de advertência nesta questão da previdência pública. Cada vez mais fica evidente o equívoco dos governos que tentam assumir a responsabilidade pela subsistência e pela felicidade dos cidadãos, comprometendo-se com benefícios que não conseguirão sustentar.
Ficou para depois do Carnaval a votação pela Câmara do projeto que cria o Fundo de Previdência Complementar do Servidor Público da União (Funpresp), que pretende corrigir a gritante distinção entre as aposentadorias dos trabalhadores do setor público e as da iniciativa privada. Se prosperar a intenção do governo, o teto da aposentadoria dos servidores passará a ser o mesmo do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), atualmente em R$ 3,6 mil. Para receber mais, o funcionário público deverá contribuir para o fundo complementar, que pagará uma aposentadoria extra a partir de 35 anos de contribuição. O objetivo da mudança não é castigar ninguém, mas, sim, reduzir o déficit da Previdência, que a cada ano se torna mais insustentável e caminha para a inviabilidade.
Atualmente, o governo paga 1,1 milhão de benefícios a servidores públicos e tem um déficit próximo de R$ 60 bilhões. O INSS tem 28 milhões de beneficiários e o déficit chega a R$ 36,5 bilhões. A correção se impõe e é urgente, até mesmo porque as mudanças só atingirão os servidores que ingressarem após a vigência da lei.
Será, certamente, um remédio amargo, especialmente para uma categoria que se habituou com as benesses do poder. Entre os principais atrativos da carreira pública estão a aposentadoria integral e o reduzido tempo de serviço até o jubilamento. Com as novas regras, os servidores terão que ficar mais tempo na ativa para fazer jus à aposentadoria integral. Entidades que congregam servidores veem nisso um risco de desinteresse dos trabalhadores mais capacitados pelo serviço público, pois poderão ganhar mais na iniciativa privada. Mas esta é uma questão secundária diante do risco de quebra da Previdência, caso o atual sistema seja mantido. Enquanto o déficit do INSS já se mantém estável nos últimos dois anos, no setor público cresce vertiginosamente a diferença entre o que o governo arrecada e paga para os servidores inativos.
A falência do Estado de bem-estar social, especialmente dos modelos vigentes na Europa, acende uma luz de advertência nesta questão da previdência pública. Cada vez mais fica evidente o equívoco dos governos que tentam assumir a responsabilidade pela subsistência e pela felicidade dos cidadãos, comprometendo-se com benefícios que não conseguirão sustentar. O aumento da expectativa de vida, associado à diminuição da população ativa, tornou inviável a sustentação dos sistemas de previdência em várias nações europeias. A demasiada proteção do Estado aos indivíduos também gerou uma população avessa ao risco e à competição, com prejuízos crescentes para a economia dos países assistencialistas.
Esse cenário internacional só reforça a necessidade de uma revisão do modelo brasileiro. O tema é complexo e vai exigir total responsabilidade dos legisladores, sejam eles favoráveis ao governo ou oposicionistas. Sua gravidade, porém, indica que não há mais margem para adiamentos. Depois do Carnaval, como diz um famoso samba-enredo, o país precisa tomar juízo – e enfrentar com coragem o dilema previdenciário.
Editorial ZH (14/02/2012)
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