A rede de escolas criadas pelo americano Mike Feinberg é um enfático exemplo de como crianças pobres podem ir longe quando estão imersas em ambientes dominados por bons mestres e onde a meritocracia é levada às últimas consequências.
Revista Veja – 19 de dezembro de 2012
Poucos na área da educação são capazes de reunir plateias tão entusiasmadas
como o americano Mike Feinberg, 44 anos – um especialista em relações
internacionais cuja opinião sobre o ensino é ouvida com atenção por autoridades
dos mais diversos matizes e nacionalidades. Feinberg está à frente de uma das
mais bem-sucedidas experiências recentes na sala de aula, as KIPP Schools –
conjunto de mais de uma centena de escolas de período integral fincadas em
áreas pobres de 20 estados americanos. A administração com um misto de dinheiro
público e privado (mas com verbas semelhantes às outras), elas mostram como é
possível forjar a excelência mesmo em ambientes tão desprovidos de estímulos.
Em recente passagem pelo Brasil, onde falou a especialistas no Instituto
Fernand Braudel, em São Paulo, Mike concedeu a seguinte entrevista a VEJA.
A escola é responsável Muitos
profissionais do ensino caem na tentação de empurrar a culpa dos fracassos para
as famílias alegando que elas não dão aos filhos os incentivos mais básicos.
Mas não é realista esperar grande protagonismo de pais que, frequentemente, não
têm tempo nem repertório intelectual para fazer mais do que já fazem. No lugar
de terceirizar responsabilidades, esses educadores devem encará-las: se o aluno
não evolui, eles precisam responder por isso. E um ambiente menos favorável não
pode servir de álibi para a incompetência.
A lição do esforço A maioria das
crianças pode se tornar eficiente em qualquer atividade à qual dedique tempo e
esforço. Se o objetivo é virar um ás do videogame, então devem se esmerar no
videogame. Agora, se a meta é alcançar um patamar elevado em leitura e
matemática, não há outro caminho se não ler, ler e ler e resolver exercícios. A
prática é fundamental. Não acredito que em um turno escolar curto demais seja
possível lidar com a complexidade de tantas áreas de conhecimento. Acaba
ficando tudo muito raso. Essa é uma clara desvantagem do Brasil em relação aos
países mais desenvolvidos, onde as crianças passam até o dobro do tempo em sala
de aula.
Quem merece avança O igualitarismo nas
escolas pode soar simpático, mas tem o efeito perverso de não estimular ninguém
a desprender-se da média. O esforço e o mérito do aluno não devem ser
escamoteados, mas, sim, enfatizados, para que ele e os outros saibam que esse é
o caminho acertado. Os professores que fazem sua classe progredir também
merecem ser destacados, recebendo não só mais dinheiro, mas ainda, e
principalmente, mais responsabilidades e desafios.
Uma visão empresarial Quando
os pais vão escolher a escola dos filhos, no lugar de priorizar uma
infraestrutura vistosa, deveriam, isso sim, saber quem é o diretor e como ele
age em prol do ensino. O diretor precisa ser, em certo sentido, como o gestor
de uma empresa. Ele deve incentivar os quadros mais talentosos e ter pulso para
se livrar dos menos eficazes. Demissão ainda é um tabu no meio educacional, mas
os bons diretores, mesmo quando esbarram na burocracia do ensino público,
encontram brechas para retirar de cena os que não funcionam.
O corporativismo contra a igualdade Os
sindicatos erram quando saem em defesa dos maus profissionais e não do bom
ensino. Acho curioso que existam mecanismos para impedir que os médicos e
advogados ruins atuem, mas não haja blindagem alguma contra os maus professores
que difundem uma educação de baixo nível. Esse pendor corporativista é um
incômodo obstáculo à qualidade.
Diversidade de cabeças Venho
do Tech for America, programa que coloca talentos de todas as áreas para dar
aulas. Essa diversidade faz um enorme bem à escola. Eu mesmo não me
especializei em educação, mas a sensação de que é possível impactar tanta gente
foi tão arrebatadora que nunca mais deixei esse meio. Sempre me perguntam:
“Qual é a fórmula mágica da KIPP Schools?”. A resposta é tão simples que parece
pueril. De um lado, reúno professores que dominam seu conteúdo e ensinam de
forma apaixonada; de outro, mantenho alunos imersos na escola em tempo
integral. Em países como África do Sul, México e Índia já existem escolas que
se baseiam nesses mesmos pilares, com sucesso. Por que não no Brasil?
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