Clássico do Clássico. Antes do texto, destaco três passagens. Leia
o artigo. Acredite em mim, vale muito a pena. Thiago
Chegar a universidades de elite apenas pela cor da pele é uma
espécie de desembarque pedagógico nas praias da Normandia
O
que fazer perante os números aterradores das políticas afirmativas? Escondê-los
tem sido uma opção, o que significa arruinar silenciosamente a vida de milhares
de pessoas para que as consciências progressistas possam dormir com as suas
vaidades intactas.
Pretender
corrigir no fim o que vem torto desde o início é destruir vidas adultas com
ilusões politicamente corretas.
Cotas
raciais nas universidades: os argumentos são conhecidos.
Para
o pensamento progressista, as cotas são uma forma de corrigir injustiças
passadas, abrindo as portas das melhores universidades a candidatos negros, ou
hispânicos, ou nativos-americanos etc.
Para
temperamentos mais conservadores, as cotas são uma nova forma de racismo, ainda
que invertido, ao reduzir a singular individualidade de cada um à mera
pigmentação da pele. E são, claro, um atentado às mais elementares noções de
mérito.
Os
argumentos são conhecidos, repito. Mas o que dizer quando duas bíblias do
progressismo americano --o "New York Times" e a revista
"Atlantic"-- publicam matérias altamente críticas sobre as políticas
afirmativas no país?
Aconteceu.
Nenhuma delas repete argumentos gastos porque a discussão deixou de ser
ideológica. Passou a ser empírica: estarão as políticas afirmativas a produzir
efeitos contrários aos pretendidos?
Ambas
respondem que sim e dão nome ao descalabro: "mismatch". Ou,
traduzindo o conceito, alunos impreparados que entram em universidades de elite
através de preferências raciais têm desempenhos acadêmicos sofríveis.
E
esse "mismatch" não se limita aos anos de formação. Ele acompanha os
indivíduos para o resto das suas vidas profissionais.
O
problema é particularmente pronunciado nas ciências, nas engenharias e nas
matemáticas, o que não admira: o conhecimento nas "ciências exatas",
relembra o "New York Times", é um conhecimento contínuo, onde é
necessária uma forte preparação de base para haver progressos contínuos também.
Sem
essa preparação, chegar a universidades de elite apenas pela cor da pele é uma
espécie de desembarque pedagógico nas praias da Normandia.
A
"Atlantic" quantifica essa carnificina: os alunos negros continuam a
preferir mais cursos de ciências ou de engenharia do que os brancos; mas o
"mismatch" faz com que a desistência entre negros seja o dobro da
verificada entre os brancos.
O
mesmo acontece depois da universidade: em direito, por exemplo, os alunos
negros são reprovados no exame de acesso à profissão quatro vez mais do que os
alunos brancos; o "mismatch" explica metade desses fracassos. O que
fazer perante os números aterradores das políticas afirmativas?
Escondê-los
tem sido uma opção, o que significa arruinar silenciosamente a vida de milhares
de pessoas para que as consciências progressistas possam dormir com as suas
vaidades intactas.
Outra
opção, sugerida sem um pingo de vergonha pelo "New York Times", é
"convidar" as instituições de elite a serem um pouco menos de elite.
No fundo, "convidar" Harvard a não ser Harvard --uma forma de
corrupção intelectual e um caminho para o atraso científico do país.
Mas
existe uma terceira via: defender a velha ideia de que competências médias devem
frequentar universidades médias.
A
"Atlantic", aliás, revela uma curiosa experiência: em 1998, a
prestigiada UCLA deixou de usar critérios raciais nas suas admissões. Resultado
imediato: queda acentuada de alunos negros (menos 50%) e hispânicos (menos 25%).
Escândalo e protestos.
Porém,
o mais espantoso é que, nos anos seguintes à abolição dos critérios raciais e,
apesar da queda, o número total de negros e hispânicos graduados pela UCLA era
semelhante ao número de negros e hispânicos que terminaram os seus cursos antes
da abolição. Por quê?
Razões
várias. Cito duas. Primeiro, porque a UCLA acabou por atrair os melhores alunos
negros e hispânicos que assim puderam frequentar uma universidade sem o
"estigma" das políticas afirmativas.
E,
mais importante ainda, porque aumentou o número de alunos negros e hispânicos
que iniciaram a sua formação em universidades mais modestas -e só depois se
transferiram para a UCLA.
Sim,
ideologicamente, sou contra discriminações positivas (ou negativas) porque sou
incapaz de reduzir qualquer ser humano a um "grupo" ou uma
"raça". E não creio que seja função da universidade prosseguir
agendas igualitárias. Apenas científicas.
Mas
existem evidências empíricas que reforçam as ideológicas: a igualdade de
oportunidades deve ser uma igualdade de base na formação de qualquer indivíduo.
Pretender
corrigir no fim o que vem torto desde o início é destruir vidas adultas com
ilusões politicamente corretas.
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