terça-feira, 19 de março de 2013

Lágrimas para o déspota

Não existe na história humana um único exemplo de sociedade sadia que não tenha respeitado a garantia de que cada cidadão possa buscar a própria felicidade e a de sua família. Sempre que deixaram ou foram forçadas perseguir a utopia do bem coletivo à custa do sacrifício dos direitos individuais, as nações viram seus governos degenerar em regimes totalitários.

Carta ao leitor REVISTA VEJA

As instituições formam o alicerce de todas as organizações sociais que permitiram o funcionamento de governos democrático, com alternância de poder e pleno respeito aos direitos humanos, entre eles a fundamental liberdade de expressão. Não existe na história humana um único exemplo de sociedade sadia que não tenha respeitado a garantia de que cada cidadão possa buscar a própria felicidade e a de sua família. Sempre que deixaram ou foram forçadas perseguir a utopia do bem coletivo à custa do sacrifício dos direitos individuais, as nações viram seus governos degenerar em regimes totalitários. O governo do venezuelano Hugo Chávez, morto de câncer na semana passada, em Caracas, foi apenas mais um desses desastres anunciados.

Teria passado despercebido não fosse a Venezuela vizinha do Brasil e dona de uma das maiores reservas de petróleo do nundo. Teria sido inofensivo para os brasileiros e para a América Latina se Chávez não tivesse usado o dinheiro dos venezuelanos pobres para exercer um imperialismo primitivo na região, com a tentativa de corromper militares no Paraguai, apoiar terrorismo na Colômbia, financiar campanhas presidenciais de esquerdistas na Argentina e no Uruguai, fomentar o desrespeito à Constituição em Honduras e comprar simpatias no Brasil.

Uma reportagem desta edição de Veja mostra que Chávez deixa uma herança maldita de desestabilização em um continente que, dado seu passado turbulento, precisa de estabilidade mais do que de oxigênio. O coronel paraquedista Chávez, autor de um golpe fracassado e depois eleito democraticamente, passou como um tanque sobre as instituições, pressionando e aparelhando os tribunais superiores. Intimidou e inviabilizou o funcionamento de redes de televisão independentes, encarcerou adversários políticos e criou milícias partidárias armadas que se confundem com os bandos de criminosos comuns. Fiel à farda, trouxe de volta os militares à cena política, o que há poucas décadas abriu as portas do inferno em quase todas as nações latino-americanas.

As multidões formadas predominantemente por pessoas pobres, as mesmas que o reelegeram três vezes para a Presidência da República, choravam nas ruas de Caracas lágrimas de genuíno pesar pela morte de seu líder. Chávez atendeu às demandas de curto prazo das massas e, no melhor estilo populista, mandou a conta para as gerações futuras. Ele fez com as ruas um pacto emocional, o que não é novidade na história das sociedades humanas. Cantores, atores, esportistas, papas e políticos populistas antes dele foram levados ao túmulo por correntes humanas de adoradores. Getúlio Vargas, no Brasil, e Perón, na Argentina, são os exemplos mais próximos. Secas as lágrimas, serenada a emoção, o povo vai aos poucos percebendo que seus santos padroeiros na política nada fizeram pela prosperidade duradoura, pela garantia das liberdades ou pelo fortalecimento das instituições. Chávez foi mais um desses.

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