Há nas ruas, nas redes sociais, em todo canto, sinais claros de enfraquecimento da metafísica petista. Percebe-se certo cansaço dessa estridência permanente contra os adversários, tratados como inimigos a serem eliminados. Se, em algum momento, setores da sociedade alheios à militância política profissional chegaram a confundir esse espírito guerreiro com retidão, vai-se percebendo, de maneira inequívoca, que aquilo que se apresentava como uma ética superior era e é apenas uma ferramenta para chegar ao poder e nele se manter.
Por Reinaldo Azevedo (Folha de SP)
O PT
ensaiou uma reação quando veio a público a avalanche de malfeitorias óbvias na
Petrobras: convocou o coração verde-amarelo da nação. Tudo não passaria de uma
conspiração dos defensores da "privataria", interessados em doar mais
essa riqueza nacional ao "sagaz brichote", para lembrar o poeta
baiano Gregório de Matos, no século 17, referindo-se, em tom de censura, aos
ingleses e a seu espírito mercantil. Não colou! A campanha não pegou. A
acusação soou velha, do tempo em que a ignorância ainda confundia capitalismo
com maldade.
Desta
vez, parece, os larápios não vão usar o relincho ideológico como biombo. Até
porque, e todo mundo sabe disto, ninguém quer nem vai vender a Petrobras.
Infelizmente, ela continuará a ser nossa, como a pororoca, o amarelão e o
hábito de prosear de cócoras e ver o tempo passar –para lembrar o grande
Monteiro Lobato, o pai da campanha "O petróleo é nosso". A intenção
era certamente boa. Ele não tinha como imaginar o tamanho do monstro que
nasceria em Botocúndia.
Há nas
ruas, nas redes sociais, em todo canto, sinais claros de enfraquecimento da
metafísica petista. Percebe-se certo cansaço dessa estridência permanente
contra os adversários, tratados como inimigos a serem eliminados. Se, em algum
momento, setores da sociedade alheios à militância política profissional
chegaram a confundir esse espírito guerreiro com retidão, vai-se percebendo, de
maneira inequívoca, que aquilo que se apresentava como uma ética superior era e
é apenas uma ferramenta para chegar ao poder e nele se manter.
A arte de
demonizar o outro, de tentar silenciá-lo, de submetê-lo a um paredão moral
seduz cada vez menos gente. Ao contrário: há uma crescente irritação com os
estafetas dedicados a tal tarefa. Se, antes, nas redes sociais, as críticas ao
petismo eram tímidas, porque se temia a polícia do pensamento, hoje, elas já
são desassombradas. E se multiplicam. Os blogs sujos viraram caricatura. A
cultura antipetista está em expansão. E isso, obviamente, é bom.
Notem:
não estou a fazer previsões eleitorais. Não sei se Dilma será ou não reeleita;
não me importa se o PT fará mais parlamentares ou menos; mais governos de
Estado ou menos. Quem me lê deve supor o meu gosto para cada uma dessas
possibilidades. Ainda que o partido venha a ter o melhor desempenho de sua
história, terá começado a morrer mesmo assim. Refiro-me, à falta de expressão
mais precisa, a uma "agitação das mentalidades" que costuma anunciar
as mudanças realmente relevantes.
Pegue-se
o caso do PT: não nasceu em 1980. Surgiu alguns anos antes, de demandas geradas
por valores a que a política institucional, as esquerdas tradicionais e o
nacionalismo pré-64, que remanescia, já não conseguiam responder. À diferença
do que ele próprio deve pensar, Lula não inventou o PT. O espírito do tempo é
que inventou Lula.
"Ah,
mas a oposição não tem projeto!" A cada dia, fica mais evidente que essa
história de "projeto" é conversa para embalar idiotas. Não é preciso
parir a novidade a cada eleição. Ao contrário: o espírito novidadeiro costuma
traduzir um vazio de ideias. Estancar a ladroagem nas estatais é uma boa
proposta. Parar de flertar com a inflação é uma boa proposta. Desmontar o
aparelhamento do estado é uma boa proposta. Estabelecer parcerias com o setor
privado, em vez de comprar a sua adesão com subsídios e renúncia fiscal, é uma
boa proposta. E nada disso compõe, exatamente, um "projeto". A
propósito: qual é o do PT?
Se
querem, para o bem do país, tirar Dilma do trono, seus adversários devem se
ocupar menos de encontrar a "pedra filosofal da oposição" do que de
lembrar que estão a falar com um povo, na média, decente, a cada dia menos
tolerante com bandidos que prometem a nossa salvação. Espero que Aécio Neves e
Eduardo Campos descubram, finalmente, a força dos indivíduos e de seu senso de
moralidade. São eles que criam o espírito do tempo. E que formam o povo.
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