Por Cora Ronai (O
Globo, Segundo Caderno, 11.9.2014)
E,
mais uma vez, vou votar sem qualquer entusiasmo. Nenhum dos candidatos à
presidência me representa sequer minimamente. Suas plataformas são amontoados
de lugares comuns, evasivas de gente covarde que não tem coragem de dizer o que
pensa ou de fazer o que deve; suas falas são colchas de platitudes mal
enunciadas que, na melhor das hipóteses, não significam nada.
Não
suporto mais o discurso dos governistas, que insistem em pintar um país que não
existe, como se fossemos todos idiotas ou desmemoriados -- e que, quando
forçados a contemplar os erros da atual administração, agem como se o PT já não
tivesse tido tempo de sobra de mostrar a que veio; mas também não aguento mais
o discurso da oposição, que só se lembra de que é contra o governo em época de
eleição.
Oposição
não existe apenas para faturar os votos dos descontentes; oposição é parte
integrante e essencial de qualquer democracia. O PSDB traiu o país e a
confiança dos seus mais de 30 milhões de eleitores quando, sem coragem de
confrontar a popularidade de Lula, optou por se fazer de morto e não defender
as suas posições.
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O o
Eu
não quero um país eternamente governado por tipos cordiais, que se entendem por
baixo dos panos. Eu não quero um país de canalhas festejados em palácio, de
criminosos tratados como heróis, de ditadores recebidos como irmãos. Não quero
um país em que ex-presidentes bajulam foragidos da Interpol. Não quero um país
em que a presidente mente sobre as suas qualificações acadêmicas e fica por
isso mesmo, como se falsificar currículo Lattes fosse coisa normal.
Não
quero um país sem valores morais.
Também
não quero um país onde presidentes possam ser reeleitos. Quero presidentes -- e
governadores, e prefeitos -- que se dediquem ao trabalho durante todo o
mandato; quero candidatos que não possam usar a máquina do estado, paga por
todos nós, para defender os seus interesses e os interesses mesquinhos da sua
curriola.
Acho
obscena a divisão do tempo da propaganda eleitoral gratuita, até por saber o
que ela implica. Não é assim que se constrói um bom país.
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O o
Não
sei o que acho pior: uma candidata que é abertamente contra o aborto, uma
candidata que não tem coragem de dizer que não é ou um candidato que se diz
satisfeito com a nossa legislação obscurantista. As três posições se equivalem.
Estamos em pleno ano de 2014, Constantinopla caiu em 1453 e, não obstante,
continuamos gastando tempo e energia com essa discussão bizantina.
Fazer
ou não fazer aborto é questão de foro íntimo. Quem for contra aborto que não
aborte, mas não queira impor as suas convicções ao resto da sociedade. Sabemos
onde isso vai dar: aí está essa pobre moça sumida, obrigada pela excelente
legislação em vigor a procurar criminosos para se livrar da gravidez
indesejada.
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O o
Na
televisão os candidatos falam em educação como se tivéssemos um sistema
educativo de verdade, que precisa apenas de alguns ajustes: todos dizem que vão
investir mais em educação, que vão aumentar o salário dos professores e o
número de vagas nas escolas e universidades. Mas de que adianta aumentar o
número de vagas em estabelecimentos onde não se aprende nada? Qual é o sentido
de formar profissionais sem a mínima empregabilidade?
A
educação brasileira está agonizante. Não há dinheiro que resolva se ela não for
repensada de alto a baixo, com o comprometimento efetivo da sociedade e de
todos os partidos, independentemente de pseudo ideologias ou de alianças de
ocasião.
O
Brasil nunca esteve tão ignorante, tão boçal, tão despreparado. Quando é que
vamos parar de fazer de conta que os nossos professores ensinam e que os nossos
alunos aprendem? A quem estamos querendo enganar com isso?
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O o
Não
há problema mais urgente no país do que a educação. Todo o resto, inclusive
saúde e segurança, se resolve naturalmente a partir do momento em que o sistema
educacional passar a formar pessoas completas, com um bom conjunto de
habilidades e a consciência da sua cidadania.
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O o
Não
são só os candidatos que me desanimam. Está difícil frequentar as redes
sociais, que em geral tanto me divertem. Política, religião e futebol trazem à
tona o que as pessoas têm de pior; consigo manter a timeline razoavelmente
livre de futebol e de religião, mas de política não tenho como fugir, já que
somos todos eleitores.
Sou
tomada por uma enorme sensação de cansaço diante dos xingamentos agressivos, da
falta de argumentação, da cegueira de todas as partes; não entendo como gente
adulta ainda pode achar graça em trocadilhos fracos como presidanta ou Aécio
Never.
Vontade
de desligar o computador, comprar uma passagem para bem longe e só voltar
depois da apuração do segundo turno.
(O
Globo, Segundo Caderno, 11.9.2014)
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