Nas democracias representativas sólidas, os papéis estão bem definidos: você escolhe seus representantes e confia neles. Se eles traírem sua confiança, você tem várias alternativas de reação, desde a troca de representantes na eleição seguinte até ações judiciais, passando por protestos públicos para constrangê-los imediatamente. (..) Já a democracia participativa é um engodo. Porque a maioria das pessoas não participa da democracia participativa. A maioria das pessoas não quer ir a conselhos, reuniões e plenárias. A maioria das pessoas quer cuidar dos seus assuntos particulares e deixar que os assuntos públicos sejam resolvidos pelos seus representantes.
Por David Coimbra (Zero Hora 7/3/2015)
O
líder não é líder porque manda; é líder porque decide. As pessoas não gostam de
tomar decisões. Você quer fazer o seu filho sofrer? Dê a ele o direito de
escolha. É uma crueldade. Criança não tem de escolher coisa alguma. Nem quer,
mesmo que diga que quer. A obrigação dos pais é decidir por ela.
Você
vai sair com uma mulher e pretende impressioná-la? Escolha você o restaurante,
a refeição, o vinho e até a sobremesa. Claro, avise-a antes, para que ela não
emburre, achando que você é autoritário:
– Vou
pedir algo que você vai adorar, está bem, sal da terra, luz dos meus dias?
Ela
vai ronronar e, no escaninho mais escondido da sua alma, cintilará a seguinte
percepção: esse cara sabe o que faz.
É
essa a imagem que passa aquele que toma decisões: de que sabe o que faz.
Donde,
o sucesso da democracia representativa. Na democracia representativa, você
decide quem tomará decisões por você. Tudo está contentado: a sua autonomia e a
sua preguiça. Essa é a forma mais inteligente, embora nem sempre seja a mais
eficiente, de fazer funcionar uma grande coletividade.
Nas
democracias representativas sólidas, os papéis estão bem definidos: você
escolhe seus representantes e confia neles. Se eles traírem sua confiança, você
tem várias alternativas de reação, desde a troca de representantes na eleição
seguinte até ações judiciais, passando por protestos públicos para
constrangê-los imediatamente. Mas, para reagir, você tem de saber o que está
acontecendo. Por isso, a maneira mais fluida de fazer a democracia funcionar é
vigiar as ações dos seus representantes.
Já
a democracia participativa é um engodo. Porque a maioria das pessoas não
participa da democracia participativa. A maioria das pessoas não quer ir a
conselhos, reuniões e plenárias. A maioria das pessoas quer cuidar dos seus
assuntos particulares e deixar que os assuntos públicos sejam resolvidos pelos
seus representantes.
A
atual crise política brasileira não é uma crise da democracia representativa: é
uma crise de governo. Foi esse governo que cedeu à tentação de corromper e de
ser corrompido. Os parlamentares envolvidos usaram o governo e foram usados por
ele. Foi uma simbiose de parasitas.
A
democracia representativa, ao contrário do que os governistas querem fazer
crer, é o remédio para sanar esses males. É o Congresso Nacional, sujeito às
pressões da sociedade indignada, que fará com que o sistema brasileiro seja
aperfeiçoado, e não um governo semi-imperial, que até agora não foi capaz
sequer de fazer uma autocrítica.
Este
é o momento de o homem comum cobrar dos seus representantes, mas não o momento
de questionar o sistema de representação. Este é o momento de glória do
sistema, porque você só poderá cobrar de seus representantes se houver
representantes a serem cobrados. Cuidado, portanto, com os inimigos do Congresso.
Eles são os inimigos da democracia.
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