sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Eles nos protegem

Essa estratégia de plebiscitos e conselhos é a mais perigosa, porque tem aparência de abertura democrática, quando, na verdade, sua intenção é solapar o Legislativo e, assim, solapar a democracia representativa. O argumento dos governistas é insidioso: eles juram que esses conselhos dariam mais oportunidades de participação “ao povo”. 

Bastaria que “o povo” se dispusesse a integrar os conselhos para, desta forma, decidir os rumos da sua própria vida. Balela. Os governistas sabem que “o povo” simplesmente não quer participar de conselho nenhum. Imagine você tendo de ir a uma plenária duas vezes por semana, ou a um seminário, ou a um debate, ou a um congresso de qualquer coisa. Que porre. 



Por David Coimbra

Quando algum amigo geme de medo de que esse ou aquele candidato seja eleito presidente, ofereço sempre o mesmo consolo:

— Não te preocupa. O Congresso nos protege.

Porque, embora o Executivo tenha tantos poderes no Brasil, como tem, o Legislativo é a verdadeira coluna de sustento da democracia. O presidente, qualquer presidente, quase sempre é acossado por gana autoritária. Raros resistiriam à tentação de se tornar ditadores, se pudessem. O Brasil teve um presidente democrata de raiz, Itamar Franco. Os outros...

Os tucanos meteram o bico em locais infectos para dar mais quatro anos a Fernando Henrique, todos sabem, e os petistas volta e meia fazem uma tentativa bolivariana, com seus plebiscitos e conselhos vários.

Essa estratégia de plebiscitos e conselhos é a mais perigosa, porque tem aparência de abertura democrática, quando, na verdade, sua intenção é solapar o Legislativo e, assim, solapar a democracia representativa. O argumento dos governistas é insidioso: eles juram que esses conselhos dariam mais oportunidades de participação “ao povo”.

Bastaria que “o povo” se dispusesse a integrar os conselhos para, desta forma, decidir os rumos da sua própria vida. Balela. Os governistas sabem que “o povo” simplesmente não quer participar de conselho nenhum. Imagine você tendo de ir a uma plenária duas vezes por semana, ou a um seminário, ou a um debate, ou a um congresso de qualquer coisa. Que porre.

Você tem mais o que fazer. Você tem o seu trabalho, os seus amigos, a sua família, o seu time, o seu cachorro, o seu sono. É por isso que a democracia representativa é tão boa: você escolhe pessoas para representá-lo nessas atividades e para estudar questões pedregosas, como reformas legislativas.

Elas estão lá para isso. Agora, se as coisas não estão indo bem, aí você tem de pressionar o seu representante, tem de protestar, tem de gritar. Mas só em casos extremos, obviamente, que você tem seus compromissos.

Conselhos do gênero seriam habitados por partidos orgânicos, como o PT, e seus agregados. Eles fazem política sistemática e profissionalmente. Eles vivem disso. Tanto que já estão infiltrados em sindicatos, associações de bairro, ONGs, igreja e universidades.

O Congresso nos protegeu (por enquanto) dos conselhos bolivarianos. Não nos protegeu da reeleição de Fernando Henrique, uma escusa mudança das regras do jogo em meio ao jogo, feita por meios mais escusos ainda.

O Judiciário também tenta sabotar o Legislativo. Veja essas novas teorias de atuação “ativa” do Judiciário, tão ativa que seus representantes não se contentam mais em agir quando provocados; eles provocam, eles são litigantes, eles faturam com as causas levantadas por eles mesmos, como fez a juíza de Livramento ao atrair para o conflito os pobrezinhos dos gaúchos tradicionalistas.

O argumento do novo Judiciário é que o Legislativo é muito lento para promover as “evoluções” da sociedade que ele, Judiciário, acha importantes. É claro: o Judiciário é uma classe só, a elite intelectual, inflada de convicções ideológicas sobre o que é certo ou errado; o Executivo é mais restrito ainda, é uma pessoa só, ansiosa para promover as mudanças que, em sua cabeça coroada, considera ideais. Já o Legislativo é legião, porque somos muitos. No Legislativo, todo o Brasil está representado, ou quase todo.

No Legislativo há os sem-terra e os ruralistas, há os jogadores de futebol e os médicos, há os militares da reserva e os guerrilheiros desarmados. O Legislativo, de fato, representa a nação. O Executivo e o Judiciário, não.

Para desespero da elite intelectual, que adeja com sua vasta sapiência por redações de jornal, tribunais e redes sociais, o Brasil também é formado por gente como os evangélicos, por exemplo, que, no Congresso, têm direito a voz e voto.

Você é a favor da legalização do aborto (eu sou), é a favor do casamento civil gay (sou também), é a favor da legalização da maconha (sou), é a favor da exigência do diploma de jornalista (contra)? Vote em um deputado que pense como você. Que defenda suas causas.

Não precisa ser o mais inteligente, basta que ele concorde com o que você acha relevante. Eleger deputados que realmente nos representem é mais importante do que eleger o presidente ideal. Os deputados estão lá para nos proteger de presidentes, juízes e demais mulheres e homens sábios que querem dizer o que é bom para nós.

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

A SATANIZAÇÃO DO SETOR PRIVADO

Os ataques à livre-iniciativa, como se os interesses de quem produz não convergissem com os da sociedade, apenas confundem o debate de ideias na campanha eleitoral.

Editorial ZH (15/9/2014)

Os ataques à livre-iniciativa, como se os interesses de quem produz não convergissem com os da sociedade, apenas confundem o debate de ideias na campanha eleitoral.


Na tentativa de atacar ideias e propostas dos adversários, parte da propaganda eleitoral vem apresentando, de forma depreciativa, o que seria a representação de executivos, empresários e banqueiros contrários aos interesses do país. São ataques articulados pela campanha do PT, que provocam natural desconforto entre quem empreende. O setor empresarial não é, no Brasil e em lugar algum em que prevaleça a livre competição, inimigo da população. É uma visão não só equivocada, mas eticamente condenável, sob qualquer aspecto, por tentar induzir ao erro de que a iniciativa privada estaria em desacordo com demandas e expectativas da sociedade.


Esperava-se que tal visão estivesse há muito superada. O setor produtivo se submete, nas democracias, às regras da competição e, se cometer desvios de conduta, é penalizado por leis e normas reguladoras presentes em todas as atividades. Atribuir aos empresários uma antipatia por programas sociais, como insinua a propaganda petista, é um desserviço ao esclarecimento das propostas dos candidatos e uma contribuição aos que apostam na confusão como tática de campanha.

É no mínimo estranho que, em uma das propagandas, crítica à proposta do PSB para um Banco Central independente, apareçam pessoas que seriam banqueiros sorrindo, ao mesmo tempo em que um locutor afirma que a ideia representa uma ameaça aos trabalhadores. Em outro comercial, sobre a controvérsia em torno do pré-sal, executivos apertam-se as mãos, porque isso representaria corte de R$ 1,3 trilhão da área da saúde.


Acusações sem base na racionalidade repetem-se a cada eleição, mas não podem ser vistas com naturalidade. Não é razoável que um partido insinue, sem contestação, que pessoas ligadas ao setor produtivo e mesmo à área financeira tenham interesses desconectados do contexto nacional. É óbvio que cada atividade tem suas peculiaridades e que empreender significa almejar resultados econômicos. Se não fosse assim, não haveria produção, emprego, renda, impostos e compartilhamento de ganhos sociais.


A tentativa de satanizar o lucro é tão anacrônica quanto a que, em décadas passadas, defendia o fim da concorrência pela estatização da produção e dos serviços. A evolução da democracia brasileira poderia dispensar esse tipo de argumento, especialmente num momento em que o governo se esforça para acalmar os empresários, diante da queda do nível de confiança dos setores industrial e do comércio e da frustração de expectativas.

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Conversa entre empreendedores: ‘Cansei desse País, vou para os EUA’

 Como toda estrutura burocrática, os sindicatos criaram seus vícios e suas estruturas de ciclo contínuo de um mesmo comando. E se tornaram máquinas estranhas. O tema que me chama a atenção é a voracidade com que os sindicatos procuram aplicar os direitos dos trabalhadores, tal categoria tem participação em lucros?

Por Leo Spigariol no Blog do Empreendedor (blogs.pme.estadao.com.br)

Às vezes, sinto-me como aquele personagem do desenho do Pica-pau, o jacaré. Na história, ele dá dois passos para frente e um para trás. No último mês, estamos discutindo muito sobre a desburocratização das microempresas que estão no sistema Supersimples. Talvez, pelo fato de estarmos próximos das eleições, o tema volta à baila.

De todo modo, não tenho a intenção de enveredar pela política, mas sim pela mentalidade que rege o funcionamento de nosso sistema administrativo – que, na essência, é o mesmo princípio que rege a nossa vida pública. Essa essência está em todas as manifestações da nossa cultura e economia.

No País, tivemos muitos avanços no último século no que diz respeito à classe trabalhadora. Descansar o final de semana ou ter um limite de carga horária são mais do que direitos, são premissas de bom senso e humanidade. Historicamente, os sindicatos tiveram papel fundamental nesse processo. Todavia, hoje percebo que algo se perdeu pelo caminho. Aquela essência perversa da nossa cultura definitivamente se apossou dos sindicatos.

Como toda estrutura burocrática, os sindicatos criaram seus vícios e suas estruturas de ciclo contínuo de um mesmo comando. E se tornaram máquinas estranhas. O tema que me chama a atenção é a voracidade com que os sindicatos procuram aplicar os direitos dos trabalhadores, tal categoria tem participação em lucros?

Bem, vamos até o “patrão” exigir essa parcela. No entanto, o que ocorre quando a empresa do “patrão” não alcançou seu ‘break-even’, ou ponto de equilíbrio. A missão deles é fazer um “acordo” calculado a partir do balanço do lucro. E se não houve lucro? A empresa não alcançou o tal ponto e lá vem a turma querendo sua parcela de direito.

Mas parcela do quê?

Um paradoxo: se não há lucro, não há o que dividir. Mas, nesse caso, o “patrão” tem de distribuir os lucros, mesmo que ele não exista. Isso é o Brasil, infelizmente. Na sexta-feira, encontrei um amigo que possui uma fábrica que emprega diretamente aproximadamente 700 funcionários. Sabe o que ele me disse? “Cansei desse País. Já iniciei o projeto de montar um fábrica nos Estados Unidos. Aqui não tem ninguém sério. As pessoas não pensam de forma coletiva. Todo mundo quer garantir o seu e ponto.”

E você, leitor e empreendedor, caso não saiba, dependendo do Estado e do tamanho de seu projeto, o governo estadunidense se compromete a pagar o salário dos funcionários até sua empresa começar a dar lucro. Ou pelo menos só começará a cobrar os impostos quando alcançar o ponto de equilíbrio. Chega a ser ‘non sense’ essa comparação entre Brasil e Estados Unidos.

Enquanto uma entidade de classe aqui no Brasil quer fazer um “acordo” e não está nem aí para real situação da sua empresa ou momento, nos EUA você tem o suporte público para isso se tornar algo saudável. Nós só conseguiremos criar um cenário favorável ao crescimento, tanto econômico quanto social, quando mudarmos essa mentalidade que constrói clãs em que cada um garante o seu quinhão. Bem da verdade, confesso que também fiquei com vontade de mudar nossa fábrica para outro país.

O lado B da democracia

Por Cora Ronai (O Globo, Segundo Caderno, 11.9.2014)

E, mais uma vez, vou votar sem qualquer entusiasmo. Nenhum dos candidatos à presidência me representa sequer minimamente. Suas plataformas são amontoados de lugares comuns, evasivas de gente covarde que não tem coragem de dizer o que pensa ou de fazer o que deve; suas falas são colchas de platitudes mal enunciadas que, na melhor das hipóteses, não significam nada.

Não suporto mais o discurso dos governistas, que insistem em pintar um país que não existe, como se fossemos todos idiotas ou desmemoriados -- e que, quando forçados a contemplar os erros da atual administração, agem como se o PT já não tivesse tido tempo de sobra de mostrar a que veio; mas também não aguento mais o discurso da oposição, que só se lembra de que é contra o governo em época de eleição.

Oposição não existe apenas para faturar os votos dos descontentes; oposição é parte integrante e essencial de qualquer democracia. O PSDB traiu o país e a confiança dos seus mais de 30 milhões de eleitores quando, sem coragem de confrontar a popularidade de Lula, optou por se fazer de morto e não defender as suas posições.

o O o

Eu não quero um país eternamente governado por tipos cordiais, que se entendem por baixo dos panos. Eu não quero um país de canalhas festejados em palácio, de criminosos tratados como heróis, de ditadores recebidos como irmãos. Não quero um país em que ex-presidentes bajulam foragidos da Interpol. Não quero um país em que a presidente mente sobre as suas qualificações acadêmicas e fica por isso mesmo, como se falsificar currículo Lattes fosse coisa normal.

Não quero um país sem valores morais.

Também não quero um país onde presidentes possam ser reeleitos. Quero presidentes -- e governadores, e prefeitos -- que se dediquem ao trabalho durante todo o mandato; quero candidatos que não possam usar a máquina do estado, paga por todos nós, para defender os seus interesses e os interesses mesquinhos da sua curriola.

Acho obscena a divisão do tempo da propaganda eleitoral gratuita, até por saber o que ela implica. Não é assim que se constrói um bom país.

o O o

Não sei o que acho pior: uma candidata que é abertamente contra o aborto, uma candidata que não tem coragem de dizer que não é ou um candidato que se diz satisfeito com a nossa legislação obscurantista. As três posições se equivalem. Estamos em pleno ano de 2014, Constantinopla caiu em 1453 e, não obstante, continuamos gastando tempo e energia com essa discussão bizantina.

Fazer ou não fazer aborto é questão de foro íntimo. Quem for contra aborto que não aborte, mas não queira impor as suas convicções ao resto da sociedade. Sabemos onde isso vai dar: aí está essa pobre moça sumida, obrigada pela excelente legislação em vigor a procurar criminosos para se livrar da gravidez indesejada.

o O o

Na televisão os candidatos falam em educação como se tivéssemos um sistema educativo de verdade, que precisa apenas de alguns ajustes: todos dizem que vão investir mais em educação, que vão aumentar o salário dos professores e o número de vagas nas escolas e universidades. Mas de que adianta aumentar o número de vagas em estabelecimentos onde não se aprende nada? Qual é o sentido de formar profissionais sem a mínima empregabilidade?

A educação brasileira está agonizante. Não há dinheiro que resolva se ela não for repensada de alto a baixo, com o comprometimento efetivo da sociedade e de todos os partidos, independentemente de pseudo ideologias ou de alianças de ocasião.

O Brasil nunca esteve tão ignorante, tão boçal, tão despreparado. Quando é que vamos parar de fazer de conta que os nossos professores ensinam e que os nossos alunos aprendem? A quem estamos querendo enganar com isso?

o O o

Não há problema mais urgente no país do que a educação. Todo o resto, inclusive saúde e segurança, se resolve naturalmente a partir do momento em que o sistema educacional passar a formar pessoas completas, com um bom conjunto de habilidades e a consciência da sua cidadania.

o O o

Não são só os candidatos que me desanimam. Está difícil frequentar as redes sociais, que em geral tanto me divertem. Política, religião e futebol trazem à tona o que as pessoas têm de pior; consigo manter a timeline razoavelmente livre de futebol e de religião, mas de política não tenho como fugir, já que somos todos eleitores.

Sou tomada por uma enorme sensação de cansaço diante dos xingamentos agressivos, da falta de argumentação, da cegueira de todas as partes; não entendo como gente adulta ainda pode achar graça em trocadilhos fracos como presidanta ou Aécio Never.

Vontade de desligar o computador, comprar uma passagem para bem longe e só voltar depois da apuração do segundo turno.

(O Globo, Segundo Caderno, 11.9.2014)





sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Por que as nações fracassam? Ou: Precisamos construir instituições sólidas, não de heróis messiânicos

Estou quase acabando a leitura do livro Porque as Nações Fracassam e já tenho a sensação que ele estará entre as melhores leituras que já fiz. A teoria do livro é tão genialmente simples, que poderíamos resumir a obra parafraseando James Carville, com uma leve alteração: "São as instituições, estúpido". Ou seja, quando as instituições funcionam, a nação prospera. 

O livro inicia comparando a duas Nogales, onde parte de um mesmo povoado pertence ao México e a outra parte aos EUA. A primeira sofre com a pobreza e corrupção endêmica. A segunda, com uma renda per capita várias vezes maior e uma cidade muito mais próspera. Se a maioria da nossa população entendesse isso, não teríamos tantos heróis messiânicos prosperando por aqui, surrupiando o suor do povo em “nome do povo”.

Destaco uma passagem para que você entenda a mensagem que o livro quer destacar.

"Nogales, Arizona, fica nos Estados Unidos. Seus moradores têm acesso às instituições econômicas americanas, que lhes permitem escolher livremente suas ocupações, adquirir educação e conhecimentos, e estimular seus empregadores a investir na melhor tecnologia, gerando salários mais altos. Têm acesso ainda a instituições políticas que lhes permitem tomar parte do processo democrático, elegendo seus representantes e substituindo-os caso se comportem mal. Por conseguinte, os políticos providenciam os serviços básicos (que vão da saúde pública e rodovias à lei e à ordem) exigidos pelos cidadãos. Os de Nogales, Sonora, não têm a mesma sorte. Vivem em outro mundo, moldado por instituições diferentes, as quais criam incentivos completamente distintos, tanto para a população das duas Nogales quanto para os empreendedores e empresas que pretendam investir ali. Os estímulos criados pelas instituições próprias das duas cidades e dos países a que pertencem são a principal causa das diferenças de nível de prosperidade econômica de um lado e de outro da fronteira."

Falarei mais sobre o assunto quando finalizar a leitura. Por hora, fique com um excelente artigo do colunista Rodrigo Constantino sobre o livro citado.

Um dos livros mais importantes dos últimos anos foi Why Nations Fail, de James Robinson e Daron Acemoglu. Partindo do mesmo espírito questionador de Adam Smith, os dois mergulharam em inúmeros dados e na história de vários países para compreender o que tornou alguns ricos enquanto outros permaneceram no estado natural de penúria.
Esqueçam Thomas Piketty e esse papo cansativo de “desigualdade social”. O foco é descobrir como retirar milhões da miséria, e não pensar em tirar dos mais ricos para dar aos mais pobres. A resposta encontrada pelos autores converge para uma palavra, de forma um tanto resumida: instituições. São essas que fazem toda a diferença do mundo.
Nos países pobres, uma elite seleta controla a política e, com isso, a economia. A sociedade acaba organizada de forma a atender apenas aos interesses desse pequeno grupo, à custa do restante do povo. Já países como Inglaterra e Estados Unidos conseguiram se livrar dessa elite política que controlava o poder e criar direitos políticos bem mais distribuídos pela sociedade, com instituições mais inclusivas.
O governo, nesses casos, passou a ser alvo do escrutínio dos eleitores, e teve de responder a suas cobranças. Sem amarras artificiais criadas pelo próprio governo para beneficiar apenas a elite política, criou-se um ambiente de amplas oportunidades econômicas para todos, por meio de uma economia de livre mercado competitiva.
Os autores comparam duas cidades coladas uma na outra, só que uma nos Estados Unidos e a outra no México. A diferença é enorme. Ao atravessar a fronteira já fica claro para o visitante que mudou de país. A origem de ambas as populações é a mesma, e o clima, o solo, as condições naturais são iguais. Mas uma é parte dos Estados Unidos, com tudo o que isso representa do ponto de vista do legado institucional, enquanto a outra é mexicana.
Há nela, portanto, incerteza jurídica, ausência de império das leis, burocracia excessiva, risco de expropriação arbitrária, altos impostos, falta de um mercado desenvolvido de crédito, monopólios estatais, etc. São as barreiras artificiais criadas pelo governo mexicano que impedem o avanço da cidade.
Nos Estados Unidos, especialmente durante o século XX, havia grande liberdade econômica e relativa segurança jurídica. Os direitos eram bem estabelecidos, e os inovadores, como Thomas Edison, podiam ficar ricos vendendo suas ideias patenteadas ou criando seus próprios negócios, obtendo crédito de terceiros. Os empreendedores, que são os que criam riqueza, eram bem tratados, encontravam um ambiente competitivo e amigável aos seus negócios.
No México, o homem mais rico é Carlos Slim, ícone de um capitalismo de laços com o estado. Sua simbiose com as elites políticas sempre foi enorme, causa de seu sucesso. Quando resolveu investir nos Estados Unidos, não teve a mesma taxa de sucesso, pois não tinha como manipular as regras do jogo a seu bel prazer. No México ele foi capaz de erguer inúmeras barreiras de entrada a novos concorrentes, algo inexistente nos Estados Unidos.
Se um país pretende deixar a miséria para trás, ele precisa de boas instituições econômicas, que ofereçam incentivos adequados para se poupar, investir, inovar e adotar novas tecnologias. A conclusão dos autores é que são as instituições políticas que moldam essas instituições econômicas. O grande desafio é construir tais instituições, sabendo que elas beneficiariam a imensa maioria da população, mas retirariam poder das elites incrustadas no estado obeso e intervencionista.
A América Latina, em sua história, sempre padeceu de um risco populista, justamente porque suas instituições políticas são frágeis e dão a oportunidade para que aventureiros e voluntaristas surjam como salvadores da Pátria, com mensagens messiânicas de que vão mudar tudo da noite para o dia, derrubar as velhas elites poderosas, apenas para colocar novas no lugar. Não é dessa forma que vamos progredir rumo à civilização avançada.
Não há substituto para o trabalho árduo e gradual que crie as bases institucionais mais sólidas. Não há atalhos para esse destino. Não se pode decretar simplesmente o progresso. O maior desafio do Brasil para as próximas décadas será construir suas instituições republicanas e democráticas, hoje tão ameaçadas pelo populismo bolivariano do PT, de forma séria e sustentável. Espero que consigamos.
Rodrigo Constantino