quinta-feira, 31 de maio de 2012

Existem países perfeitamente fascistas, sem que se saiba.

Sei que a expressão fascista pode parecer extremamente forte, nos dias que correm, para designar um país, mas é o que me veio à mente, após acumular, mentalmente, dezenas e dezenas de exemplos banais, corriqueiros, ordinários, redundantes, enfim, triviais, que confirmam o que afirmo no título deste texto. Minhas observações, não preciso estender-me a respeito, são retiradas do que leio na imprensa diária, nas matérias de jornais internacionais, em blogs de formadores de opinião, e também, por que não dizê-lo?, em boletins partidários e de grupos políticos, enfim, um pouco de tudo o que leio continuamente, regularmente, recorrentemente, todos os dias.

Sei também que os leitores podem achar que estou exagerando, já que, para a maior parte das pessoas, a expressão “fascista” vem sempre associada à imagem dos camisas negras, ou milícias armadas, desfilando – a passo de ganso ou em qualquer outro estilo – sobre fundo de cenários cinzentos, dominados por um ditador exaltado, fazendo discursos de ódio e incitando a massa do povo contra um inimigo qualquer. Mas essa é uma vinculação historicamente datada, que enfatiza mais os movimentos reais que existiram na Europa do entre-guerras (e por imitação em outras partes do mundo também), do que a essência do “ser fascista”, que está presente cada vez que alguns dos elementos abaixo domina o cenário público de um país e penetra nas consciências das pessoas, sem que elas tenham sequer consciência de que estão vivendo – que sabe até aceitando, maquinalmente – num país perfeitamente fascista, em sua essência.

Essas imagens estereotipadas de um regime fascista correspondem apenas à sua superfície, ou embalagem externa, atualmente um tanto ridículas, sobretudo depois que Charles Chaplin imortalizou a figura do ditador ridículo em seu filme explicitamente vinculado a dois exemplos do gênero, mas é claro que características externas não esgotam a essência do que é ser fascista. Explico as razões de minha adesão a essa expressão, para que meu título tenha mais consistência empírica e venha ilustrado por manifestações concretas da realidade que vivemos, atualmente, em países talvez conhecidos dos leitores. Vejamos alguns fatos, não opiniões.

Em qual país, senão num país fascista, o chefe de um dos poderes constitucionais tenta subordinar, dominar, emascular, castrar ou controlar os demais poderes, usando para isso de todos os golpes baixos de que é capaz, inclusive os serviços de inteligência, a sua “polícia política”, os seus esbirros partidárias, mediante compra de consciências e de vontades, por meio da chantagem, da corrupção, das insinuações diretas, da conquista por vantagens materiais ou intimidação pura e simples?

Em que país se observa uma tal concentração de poder, pela desmesura e apropriação de recursos, monopolizados por quem controla as alavancas de extração de recursos e de distribuição seletiva e arbitrária desses recursos? Qual o país no qual o Estado central consegue controlar frações importantes da riqueza nacional, sem que a massa dos cidadãos, e sequer seus representantes eleitos, possam controlar devidamente, e na mais perfeita transparência, a coleta, o tratamento e a distribuição (com alguns descontos pelo caminho, está claro) desses recursos? Esse país só pode ser um país perfeitamente fascista, ainda que seus cidadãos disso não se apercebam.

Em que país o Estado central concentra mais e mais poderes e recursos, fazendo com que indivíduos privados, em seu papel de produtores ou de consumidores, sejam convertidos em dependentes obrigatórios desse Estado centralizador e monopolista? Qual o país que coloca na lista de pagamentos do Estado, ao mesmo tempo, o mais miserável dos excluídos e o mais ricos dos seus milionários? Só pode ser um país fascista.

Qual o país no qual o mesmo chefe, ungido à condição de nosso guia, líder genial dos povos, intérprete da vontade nacional, se pretende iniciador de tudo de positivo que existe – segundo lista que ele mesmo decretou como exclusiva de sua vontade – e passa o tempo fazendo autoelogios e propaganda de si mesmo? Em qual país a máquina pública é colocada a serviço do egocentrismo autista do chefe supremo, e gasta rios de dinheiro fazendo propaganda enganosa sobre suas virtudes inigualáveis e suas realizações inéditas? Tem de ser num país fascista.

Em qual país os órgãos de controle fiscal e econômico têm todo o poder e arbítrio para invadir sua privacidade, decretar o que é ou não válido em suas contas privadas, se permitir presumir intenções ou ações passíveis de punição administrativa, pelo simples fato que esse órgão pode decretar, ao seu bel prazer, o que os indivíduos podem ou não podem fazer com seu patrimônio, renda ou ganhos. Onde mais esses mesmos órgãos, mesmo quando pensam “fazer o bem” aos empresários e trabalhadores, “decretando” um favor qualquer no plano regulatório ou tributário, impõem um tal número de normas e regulamentos tão complicados, sujeito a uma burocracia kafkiana, que acaba tornando aquele favor um inferno adicional, digno do mesmo escritor mas jamais por ele descrito em detalhes? Só pode ser num país basicamente fascista, no direito e nas práticas.

Em qual país, um outro órgão supostamente constituído para a defesa da saúde pública, impede farmácias de vender chiclete e impede cidadãos de alcançar eles mesmos uma simples cartela de aspirina nas estantes das mesmas farmácias? Isso é fascismo puro.
Como chamar um país que pratica racismo oficial, que pretende dividir os cidadãos entre uma minoria dita desprotegida, e todos os demais cidadãos, baseando-se para isso apenas na aparência externa, e que recorre para dirimir casos duvidosos a tribunais raciais? Qual o país no qual militantes da mesma causa racial, divisionista, segregadora, ilegal, pretende tornar obrigatórias cotas raciais em todas as esferas da vida pública, e quer ainda impor os mesmos critérios sobre empresas e instituições privadas? Isso é fascismo no mais alto grau de degeneração mental.

Qual o país no qual o Estado se torna tão onipotente e avassalador que, desde os mais simples cidadãos até os mais ricos empresários, todos se sentem obrigados, compelidos, ou até mesmo o fazem inconscientemente, a recorrer ao Estado como o nec plus ultra da vida social, como o Deus ex machina de todas as soluções possíveis aos problemas e dilemas dessa sociedade, como se não houvesse outras forças na sociedade do que a do Estado que tudo pode, tudo pensa, tudo provê, tudo supervisiona, em tudo interfere, mesmo nas esferas mais recônditas da vida privada, como a educação dos filhos, as opções sexuais das pessoas, o que elas podem ver ou não na televisão, o que elas devem estudar nas escolas, enfim, tudo o que perpassa a vida de cada um, da concepção até depois de morto e enterrado? Já estamos aqui no fascismo total...

Em que tipo de país, um partido hegemônico pretende controlar a imprensa, determinar como devem ser organizados os meios de comunicação, escolhe quem subsidiar nas artes e na cultura, repassa dinheiro para os amigos do poder, escolhe quem vai ser o vencedor de concorrências públicas (e que depois será obrigado a submeter-se à extorsão financeira do mesmo partido), enfim, corrompe todos os canais e instrumentos da administração pública e coloca militantes descerebrados nas engrenagens do poder, para justamente ter o controle de todas as instâncias da vida pública e privada dos cidadãos? Já estamos vivendo num sistema fascista, com estas características.

Que nome dar a um país que se deixou dominar por um sistema de tipo mafioso, e totalitário, em que a obediência total e absoluta é devida ao semideus que controla o sistema e tem a palavra final sobre o que pode e o que não pode nesse país? Em que tipo de país mandarins oficiais, marajás estatais, corporações organizadas de servidores ditos públicos, servem-se da máquina pública para fins privados, chantageiam os cidadãos que necessitam dos serviços públicos, submetem empresários que dependem desses serviços para produzir renda e riqueza e no qual, as mesmas pessoas acham que possuem um direito divino aos recursos públicos apenas porque estão no Estado? Só pode ser um país fascista, isso é evidente.

Qual o país no qual os ditos servidores não precisam prestar contas à sociedade, têm direito à estabilidade imediata, se aposentam com inúmeros privilégios – que já tinham antes na vida ativa – em relação a equivalentes funcionais do setor privado, e ainda acham que prestam um grande favor à sociedade? Em qual país acadêmicos e trabalhadores ditos intelectuais acham que a sociedade lhes deve por direito pagar salários elevados sem que disso eles necessitem prestar contas, sem qualquer critério de produtividade ou de resultados, como se fossem marajás entronizados numa torre de marfim? Tem de ser um país de mentalidade e comportamentos fascistas, está claro.

E, finalmente, em qual país, senão num país fascista, todas essas características ainda despertam admiração e orgulho, adesão inconteste e louvores exagerados, como seu o chefe absoluto do Estado total fosse a vontade eterna consolidada na figura em questão? Não pode ser senão num país fascista.

O fascismo, antes de exibir atributos materiais de tal ou qual movimento ou partido político, e de se manifestar concretamente num regime determinado, historicamente existente, constitui, primordialmente, um “estado mental”, uma feitura especial da psicologia humana que corresponde àquilo que alguns psicanalistas, psicólogos ou sociólogos chamariam de “personalidade autoritária”. O fascismo, antes de ser de direita, de esquerda, ou de qualquer outra corrente determinada do pensamento político dos últimos dois ou três séculos, emerge de pulsões e comportamentos perfeitamente autoritários, e mesmo totalitários, implicando numa vontade de dominação que parece resultar de algum desvio de personalidade.

Não se trata de um fenômeno ou processo puramente individual, mas deriva de tendências psíquicas e mentais profundamente entranhadas no comportamento individual e coletivo de milhares, talvez milhões de indivíduos que, ao longo dos séculos, e provavelmente no decurso da história humana conhecida, se alçaram a posições de mando e de dominação com base nessa vontade extrema de mandar e dominar outros seres humanos. O fascismo, em sua essência, é isso: uma pulsão inexcedível para o comando e a dominação absoluta, uma intolerância com respeito à liberdade humana e uma incapacidade de conviver democraticamente, segundo os parâmetros de uma sociedade normal, civilizada. O fascismo sempre é monopolizador, destruidor das vontades alheias, monopolizador dos instrumentos de controle social, arrebatador de todas as atenções e exigente de obediência total e absoluta.

Pois, ou eu muito me engano, ou tenho descoberto evidências empíricas, factuais, materiais, de mentalidades, comportamentos, atitudes e práticas fascistas aqui e ali, sempre que me volto para algum lugar, percorro sua imprensa, leio o que escrevem seus “intelequituais”, ouço as perorações de alguns de seus chefes políticos, e me espanto, de verdade, ao constatar como meus colegas e concidadãos não percebem que estão em face de um país fascista. A maior parte da massa não tem, obviamente, condições de fazer um julgamento elaborado a esse respeito. Mas eu me pergunto como acadêmicos, pessoas bem informadas, empresários que se sacrificam para viver dentro da lei (e pagam caro por isso), como todas essas pessoas não se dão conta que estão vivendo sob um regime de tipo fascista?

Este é mistério para mim...


Paulo Roberto de Almeida
Berlim, 2398: 31 Maio 2012

FORA DE CONTROLE - Se Dilma Rousseff estiver interessada em resolver muita coisa que faz o governo brasileiro ser tão ruim, consulte a Receita Federal

"Se repetisse em metade do seu governo o que a Receita faz com tanta competência (...), a presidente talvez entrasse para a história do Brasil como uma heroína - a Santa Guerreira que venceu o Dragão da Maldade"

Por J. R. Guzzo
Se a presidente Dilma Rousseff estiver interessada em resolver muita coisa que faz o governo brasileiro ser tão ruim, uma boa ideia pode ser encontrada bem perto do seu local de trabalho, em Brasília mesmo, na Quadra 03, Bloco O, do Setor de Autarquias Sul.

É onde funciona a Receita Federal brasileira, e a presidente ganharia de graça, ali, uma grande lição. Bastaria perguntar como foi resolvida uma questão fundamental para a própria Receita, e para o interesse público – o recebimento, a cada ano, das declarações do imposto de renda.

Se repetisse em metade do seu governo o que a Receita faz com tanta competência nessa operação, a presidente talvez entrasse para a história do Brasil como uma heroína – a Santa Guerreira que venceu o Dragão da Maldade.

É esse bicho que comanda a inépcia, a preguiça e a burrice da burocracia nacional.

25 milhões de declarações — sem papel, fila, formulário ou firma reconhecida

A Receita Federal acaba de receber mais de 25 milhões de declarações de renda – quase tudo pela internet, sem que ninguém precise sair de casa, falar com um único funcionário ou fazer fila. Não há papel de espécie alguma. O contribuinte não tem de preencher formulários ou enviar qualquer documento – nem comprovantes da renda que recebeu, nem recibos das despesas que teve.

A Receita não lhe manda protocolos ou certidões; fica tudo registrado no computador. O cidadão não precisa assinar nada – e se não precisa assinar também não tem de reconhecer firma. O que vale é a sua assinatura eletrônica, que o identifica como autor da declaração.

Ao fim das contas, o Fisco ganha porque consegue receber; a população ganha porque consegue declarar. É um espetáculo de classe mundial. E, também, uma prova indiscutível de que pode haver eficácia na máquina pública.

Por que, num governo que funciona o mal, há um serviço que funciona tão bem? É comum ouvir-se que a tecnologia fez tudo. É um equívoco.

O x da questão não foi a tecnologia, mas as ideias inteligentes

O que realmente ganhou essa parada foram as ideias inteligentes, e não a eletrônica.

A primeira delas foi perceber que o verdadeiro inimigo era a burocracia da Idade da Pedra que envenena o poder público no Brasil; se tivesse de se conformar com as suas regras, a Receita não conseguiria, fisicamente, manter vivo o imposto de renda.

Adotou, então, um princípio brilhante: mandar para o diabo as normas idiotas, caprichosas e inúteis que ameaçavam a execução de uma das suas principais tarefas e recomeçar do zero com um sistema destinado, acima de tudo, a resolver o problema que tinha de ser resolvido.

A segunda atitude foi decidir que o contribuinte, em sua declaração, não tem de provar nada. Ele é, simplesmente, o responsável pelo que declara; depois, se houver problemas, tem de comprovar o que afirmou. É o contrário, exatamente, da postura sagrada da administração pública brasileira.

É pouco comum que se aponte algum mérito num órgão do governo – especialmente nesse, a Receita Federal. Com a possível exceção de Jesus Cristo, que ficou a favor do publicano desprezado por todos, jamais alguém gostou de um coletor de impostos ao longo da história humana.

Tudo bem – mas o fato é que, com as declarações de renda, a Receita tem feito um trabalho impecável. Daria para imaginar algo parecido no resto do governo?

Os sinais não são nada bons.

A presidente Dilma não gosta dessa conversa; já chamou de “cegos” os que propõem simplificar o governo.

A cada dia, em leis, decretos e regulamentos, mais 2 milhões de palavras vindas do poder público

Acha, ao contrário, que o importante é ter mais “controles”. Recentemente, ainda, falava-se em Brasília sobre uma “reforma gerencial” pela qual seria possível controlar a cada quinze minutos quantas pessoas pegaram senha nos postos do INSS, obrigar os ministros a apresentar relatórios semestrais de resultados ou enviar direto para a sala da ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, e durante as 24 horas do dia, imagens do que está acontecendo nos aeroportos – embora não esteja claro o que a ministra Gleisi pode fazer com tanta imagem assim.

Enquanto isso, segundo reportagem recente de O Estado de S. Paulo, o poder público escreve mais de 2 milhões de palavras a cada dia útil, na forma de leis, regulamentos, decretos e por aí afora. Um livro que reunisse só a legislação tributária atual pesaria mais de 7 toneladas.

É o estouro de uma manada de mamutes

Ou seja, o que está acontecendo, mesmo, é uma situação que fugiu a qualquer tipo de controle – o exato oposto do que quer a presidente.

Mas Dilma, ao contrário da Receita, acha que reduzir a quantidade de mamutes é uma ideia falida.

Vai acordar amanhã, como todos nós, com mais 2 milhões de palavras na cabeça.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

A universidade não é pra todo mundo. Aço é forjado no ferro, no fogo, na martelada. Harvard não tem 19 prêmios Nobel facilitando a vida das pessoas

Muito muito bom! Me deliciei vendo essa entrevista do professor Nailor Marques Jr. Adoro ver pessoas inteligente falando, principalmente falando o que deve ser dito.
Ele toca no assunto do politicamente correto brilhantemente, assunto esse que trato aqui com alguma frequência (recomendo esse meu artigo aqui). 
Dá uma olhada abaixo em alguns trechos da entrevisto. Um primor na minha opinião. Se não quiser ver toda a entrevista, veja do minuto 17 ao 20 e se divirta.


O Brasil está formando uma geração de fracos, de gente fraca. (..) Hoje você não pode mais criticar ninguém. 
(..) O politicamente correto é um chato. Primeiro que não existe politicamente correto. Se é político não dá pra ser correto. Se for correto dificilmente será politico.

(..) Quando você aprova uma cota, igual o STF aprovou, eu rebaixo o nível para colocar as pessoas ali. (..) O que a gente precisa é: Você tem uma proteção até um tanto e vamos engrossar a escola. (..) A universidade não é pra todo mundo.(..) A universidade tem que dar um tranco no povo. Aço é forjado no ferro, no fogo, na martelada. (..) Harvard não tem 19 prêmios nobel facilitando a vida das pessoas. 

(..) Não vamos construir uma grande nação fingindo que o fraco não existe. Existe gente fraca e gente forte e tem coisas que não é pra gente fraca. 

(..) Proteção demais desprotege.



Demóstenes no Conselho de Ética – Dr. Jekyll tenta explicar Mr. Hyde

Se Demóstenes fosse um José Dirceu, teria mobilizado em sua defesa o tipo de eleitor que vota em… José Dirceu — e isso quer dizer que todas as lambanças seriam consideradas atos de resistência de um “herói do povo brasileiro”. Mas o eleitorado de perfil conservador, que é aquele que o senador havia conquistado, não o perdoa, não! Dirceu se tornou ainda mais Dirceu quando os crimes do mensalão vieram à tona. Demóstenes deixou de ser Demóstenes quando o conteúdo das fitas se tornou público. E ele certamente sabe disso. O senador deixou perplexa e indignada uma legião de admiradores. O fãs de Dirceu o chamam de “herói”. Os antigos fãs de Demóstenes se consideram, e foram mesmo!, traídos. 


Por Reinaldo Azevedo (leia o artigo na íntegra)

domingo, 27 de maio de 2012

O mudo falante - Em nome da governabilidade, alguns fazem coisas que até o diabo duvida

Antes do excelente artigo de Flavio Tavares, uma declaração de Alceu Collares que resume a politica atual:


A verdade é que os partidos foram se esvaziando de ideias, de princípios e de ideologias. Em nome da governabilidade, alguns fazem coisas que até o diabo duvida. Aos olhos da população, ficaram todos iguais – lamenta o ex-governador Alceu Collares, um dos ícones do PDT no Estado.


O mudo falante


Por Flávio Tavares*
O que mais me inquieta na sucessão de falcatruas, subornos e outras obscenidades do tal Carlinhos Cachoeira não são os crimes em si, nem a avalanche com que se expandiram de Goiás pelo país afora, corrompendo governos e governadores. Nem me inquieta que, a partir da roubalheira do jogo do bicho e dos bingos, ele virasse respeitável “grão senhor”, adulado por políticos e parlamentares, ouvido pela maioria dos partidos. Ou (corolário de tudo isso) que ele e os asseclas formassem grandes empresas contempladas em milionárias obras governamentais.

Esse horror é “normal” no país. Em meio às migalhas do Bolsa-Família ou às radiosas dívidas do crediário, já nem ligamos para o grande crime. Basta a preocupação com o assalto de rua e a poluição ou a seca brutal agravada pelo desmatamento constante. Se a tristeza crescer, há o futebol e a felicidade de que a Copa será aqui, como raio de luz!

Na rapina do bando de Cachoeira, é inquietante ver o escudeiro que ele tem ao lado. O ministro da Justiça dos quatro primeiros anos do governo Lula da Silva é agora seu defensor absoluto. Não atua como advogado tratando das formalidades para evitar absurdos processuais, mas como avalista do que ele fez ou faz. Antes de ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos foi presidente nacional da OAB e, como tal, conquistou o respeito geral. Agora, na CPI do Congresso, acompanhou Cachoeira em tudo. Porte altaneiro (como se defendesse Cristo ou Tiradentes), ordenou que se calasse ou cochichou ao seu ouvido as poucas frases que o mafioso repetiu como boneco de ventríloquo.

O direito à defesa é inerente à Justiça e os advogados criminais estão habituados a defender bandidos. Mas como será um ex-ministro da Justiça defendendo a quem abusou do próprio Estado? A quem subornou, corrompeu e atingiu direitos fundamentais de milhões de pessoas, ludibriadas pela máfia e afetadas, também, pelo desvio de verbas para escolas e hospitais?

No emaranhado da corrupção generalizada, pode (por ética) um ex-ministro continuar a advogar, usando na defesa do crime o que aprendeu nas entranhas do poder? Pode um ex-ministro da Justiça (que, até 2006, comandou durante quatro anos a Polícia Federal) advogar para um notório mafioso investigado pela própria Polícia Federal?

Enfronhado, como ninguém, dos labirintos policiais, conhece ele seus meandros e fragilidades. E sobre isso irá construir a defesa. Assim, defenderá o crime pelo que aprendeu, conheceu e comandou como ministro no combate ao crime? Fará a defesa do criminoso sobre as mesmas falhas e fragilidades do sistema, no qual penetrou a fundo como ministro?

Quem será o autêntico? O ministro da Justiça de ontem, na gestão Lula da Silva, que nos protegia da bandidagem e tinha poder sobre a Polícia Federal? Ou o advogado de hoje, que cochicha em público aos ouvidos do mafioso, para tentar ludibriar o que a Polícia Federal constatou?

Pode-se fingir ontem e fingir ao contrário hoje? Ou – entre o crime e a lei – há só um lado e somos autênticos apenas em um deles? Ou tudo é teatro de rua, e a empulhação está em todos os cantos do poder? E, lá, nada é nada, não há ética nem pudor, e só interessa enganar em busca de milhões?

Nisso tudo (numa ilação paradoxal), lembrei-me do cardeal dom Vicente Scherer. O que seria dele se, após deixar o Arcebispado de Porto Alegre, se dedicasse ao oposto do que pregava e, a partir do que ouviu nas confissões dos fiéis, fosse dirigir um prostíbulo?

Seria ele a figura admirada e querida que é, pela abnegação com que reergueu a Santa Casa de Misericórdia para servir ao Rio Grande inteiro? Ou seria um mudo falante?
*JORNALISTA E ESCRITOR

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Lei trata trabalhador como menor de idade, diz Odebrecht


Ao não dar espaço a negociação entre empresários e trabalhadores, legislação é um desestímulo à competitividade, na avaliação dos presidentes da Odebrecht e Bosch



Ao predefinir toda a relação entre empregado e empregadores, a lei brasileira atua como um obstáculo à competitividade brasileira
, segundo Marcelo Odebrecht, presidente da companhia do mesmo nome. “A legislação trata o trabalhador como menor de idade. É preciso permitir mais liberdade de negociação”, afirmou o executivo durante o Fórum EXAME CNI, evento que abordou, nesta quinta-feira, os desafios da competitividade nacional.

A avaliação do presidente da Bosch América Latina, Besaliel Botelho, vai na mesma direção: o Brasil precisa “aprender” e se valer da flexibilidade da jornada de trabalho para se posicionar diante da volatilidade da economia mundial. “A própria Alemanha conseguiu não demitir ninguém com a flexibilização da jornada de trabalho, em 2008”, afirmou o presidente. Segundo a Bosch, o déficit da balança comercial do setor de autopeças, um dos que mais sofrem com a importação, foi de R$ 4,6 bilhões em 2011. O estimado para este ano é de R$ 5,3 bilhões.

Para o presidente da Odebrecht, o Brasil atingiu o limite na valorização da renda do trabalhador. “Chegamos um ponto em que só dá para aumentar a renda se alterarmos a estrutura da legislação”, disse Marcelo Odebrecht. O ganho real - acima da inflação - dos salários dos trabalhadores do setor de autopeças, por exemplo, foi de 26% desde 2004.

Na avaliação dos presentes no fórum organizado pela EXAME e pela Confederação Nacional da Indústria, o problema é que este aumento não foi acompanhado por grandes ganhos em produtividade ou mudanças na legislação. “Tem que incentivar mais renda, mas com mais produtividade”, disse o CEO da Odebrecht no Brasil.

Entre os exemplos enfrentados pela construção civil, segundo o executivo, estão o elevado número de empregados que querem sair do emprego após um ou dois anos, de maneira a usufruir do FGTS. Além disso, em negociações salariais, a Participação sobre Lucros e Resultados (PLR) tem sido encarada como um 14º salário, e não como estando vinculada à produtividade.

Outro entrave é que no Brasil os salários são nivelados por função. “O carpinteiro de um dia de trabalho tem que ganhar a mesma coisa do que quem tem 20 anos de serviço”, afirmou Marcelo Odebrecht.

Fonte: Exame.com

terça-feira, 22 de maio de 2012

Sou "doente" mas sou feliz

Digo "sim" ao indivíduo; o PT é que diz "não". Digo "sim" à sociedade civil, livre, até onde for possível, da sombra do Estado; o PT é que diz "não". Digo "sim" à cultura capitalista; o PT é que diz "não". Digo "sim" à punição dos que transgridem as leis democráticas em nome de uma causa; o PT é que diz "não". Digo "sim" à profissionalização das carreiras públicas; o PT é que diz não. Digo "sim" à venda de estatais; o PT é que diz "não". 


A acusação de antipetismo vem sempre acompanhada de manifestações inequívocas de ódio e até da promessa de algum sopapo: 'Se te encontro na rua, seu careca cheio de tumores...'. A suposição subjacente é a de que, não fosse um estado mórbido, físico ou espiritual, eu estaria com eles. O dissenso é visto como uma invasão tumoral"

(..) Minha agenda não é negativa em relação a essa legenda, mas positiva na aceitação de alguns marcos que já tinham história quando o partido veio ao mundo. Digo "sim" à liberdade de imprensa; o PT é que diz "não". Digo "sim" ao indivíduo; o PT é que diz "não". Digo "sim" à sociedade civil, livre, até onde for possível, da sombra do Estado; o PT é que diz "não". Digo "sim" à cultura capitalista; o PT é que diz "não". Digo "sim" à punição dos que transgridem as leis democráticas em nome de uma causa; o PT é que diz "não". Digo "sim" à profissionalização das carreiras públicas; o PT é que diz não. Digo "sim" à venda de estatais; o PT é que diz "não". Digo "sim" (supremo pecado!) ao imperialismo americano. O PT é que prefere ser conduzido por fanáticos bolivianos. De fato, como se vê, não sou antipetista. O PT é que é antidemocrático e antiliberal e tenta, na prática, mudar a natureza das conquistas que, entendo, me fazem livre, nos fazem livres.(..)

(..)A mesma impostura que está dada, entendo, pela "estagnabilidade", que é como defino o modelo econômico petista: a soma de estabilidade com estagnação, caracterizada por baixo crescimento e assistencialismo agressivo, produzido à custa do esmagamento da classe média e de uma repulsa ao que a economia de mercado tem de mais virtuoso – a competição, o individualismo, o espírito empreendedor. O petismo transforma o brasileiro num subordinado mental do Estado, pouco importa sua classe social. O horizonte do partido não é mais uma sociedade sem classes, mas classes que não encontrem outra forma de representação política fora do partido.

Por Reinaldo Azevedo - Artigo na íntegra aqui

É possível obrigar um pai a ser pai?

A “filha abandonada” encarna a época dos adultos infantilizados – e dos cidadãos-filhos diante do Estado-pai

ELIANE BRUM (jornalista, escritora e documentarista)

Na semana passada, o Superior Tribunal de Justiça tomou uma decisão inédita no Brasil: determinou a um pai o pagamento de R$ 200 mil por “abandono afetivo”. Antonio Carlos Jamas dos Santos, empresário do ramo de combustíveis de Sorocaba, no interior de São Paulo, terá de pagar à sua filha, Luciane Nunes de Oliveira Souza, professora da rede municipal da mesma cidade, por sua ausência como pai. Na sentença, manchete da maioria dos jornais brasileiros de quinta-feira (3/5), a frase lapidar da ministra-relatora do caso, Nancy Andrigui: “Amar é faculdade, cuidar é dever”. Nos dias posteriores, Luciane deu entrevistas, em que chorou muito pelo abandono, assim como comemorou a vitória dos filhos abandonados do Brasil, representada pelo seu triunfo no tribunal. Minha pergunta: é possível – e desejável – que um pai seja condenado por falta de afeto?

Apesar da frase de efeito da ministra, é disso que se trata. Este pai, agora condenado, pagou uma pensão para a filha até os 18 anos. Portanto, deu as condições materiais para o seu sustento, o que é garantido pela legislação brasileira há muito e não está em discussão. Se o valor era abaixo das necessidades concretas da filha e abaixo das possibilidades concretas do pai, esta é uma falha de quem arbitrou a pensão – uma falha da Justiça, portanto.

Estou rodeada de pessoas que acreditam que seus pais não lhes deram o afeto que mereciam. Acho mesmo que boa parte das pessoas acha que seus pais são deficitários no quesito afeto e no quesito presença. Da mesma maneira que, se fôssemos perguntar aos pais – e também às mães –, boa parte deles compartilha da convicção de que são abandonados pelos filhos. Mas esta, decididamente, não é a hora dos pais. Os filhos reinam absolutos nesse momento histórico, com o apoio irrestrito do Estado.

Se os pais derem uma palmada em uma criança, logo estarão cometendo uma infração. O Congresso prepara-se para determinar que palmadas são inaceitáveis como método educativo. Se a conclusão for a de que os pais não amaram bem, a Justiça pode obrigar os pais a indenizar os filhos com o valor equivalente ao de um apartamento. Em breve, suponho, teremos mais novidades na vigilância dos pais pelo Estado. E não estou sendo irônica. É para esse mundo que temos caminhado. E é preciso perceber que temos dado sempre um passo além. Em minha opinião, além do bom senso.

Se um pai espanca um filho ou qualquer pessoa espanca uma criança, já existe lei para punir esse ato bárbaro. Mas, não, em vez de aprimorar as ações de prevenção e tornar mais eficiente a repressão, considera-se necessário criar mais uma lei e punir também a palmada. Se um pai não garante as condições materiais para assegurar educação, alimentação e casa para um filho, também já existe lei para obrigá-lo a cumprir o seu dever. Mas agora é preciso ir mais adiante, é necessário punir também a falta de afeto.

Coloco essas duas questões – a da “palmada” e a do “abandono afetivo” – no mesmo texto, porque, ainda que venham de instâncias diferentes do Estado, elas me parecem emblemáticas dos novos tempos que vivemos. E tenho dúvidas se refletimos o suficiente sobre o que estamos fazendo ao achar aceitável que o Estado entre na casa das pessoas e julgue o subjetivo. Tudo isso vem embalado “em nome do bem”. Mas me parece que “o bem”, assim como “as boas intenções”, tem trilhado caminhos estranhos.

Como um juiz pode determinar o que é “abandono afetivo” em uma relação complexa como a de pais e filhos? E por que o Estado deveria fazer isso? E por que deveríamos achar legítimo que o faça?

Não tenho dúvidas de que Luciane sofreu. E desconfio que seu pai também pode ter sofrido. E gostaria que o sofrimento de ambos jamais tivesse se tornado público, porque acho que isso deveria seguir sendo tema do privado – longe da mão do Estado e longe dos holofotes. Mas, como abri a porta do meu apartamento na semana passada e me deparei com o rosto de Luciane no jornal, é preciso pensar sobre isso.

As imagens de Luciane, com sua expressão sofrida e chorosa, mesmo quando sorridente, provocam-me aflição. Porque é uma mulher de 38 anos, mãe e professora, dizendo coisas como: “Desde que eu nasci, meu pai nunca me quis!”. Eu facilmente poderia ver essa frase na boca de uma adolescente falando com as amigas num bar ou no pátio da escola. Mas, em uma mulher adulta, essa queixa – e uma queixa pública, com acolhimento público – me causa estranheza. Como se estivesse fora de lugar, deslocada no tempo de uma vida.

Luciane se coloca numa posição infantilizada. E me parece que ela encarna a posição infantilizada na qual todos nós nos colocamos ao permitir que o Estado legisle e arbitre sobre como devemos amar ou como devemos educar um filho. Como se jamais nos tornássemos adultos, na medida em que precisamos de um Estado-pai para nos dizer o que fazer. Um Estado que cada vez mais se arma do direito de entrar dentro das nossas casas e determinar como devemos viver.

São tempos curiosos. E o mais curioso é que a tese do “abandono afetivo” seja acolhida na mesma época em que a família já não é mais aquela. Nem sempre o pai biológico é aquele que assume a função paterna. Ou a mãe biológica é aquela que desempenha a função materna. As combinações, hoje, são as mais variadas. E nem sempre o pai que paga as contas é o pai que busca na escola, coloca a criança no colo, conta histórias antes de dormir, repreende um deslize ou conversa sobre a iniciação sexual da filha ou do filho. Pode ser – e pode não ser.

A função paterna pode ser assumida pelo padrasto, por um tio, por um irmão mais velho, pelo avô ou mesmo por uma mulher, em um casamento gay. E o mesmo acontece com a função materna. Para ser pai ou mãe, não basta gerar uma criança, é preciso “adotá-la”. E isso vale também para os pais biológicos. E nem todos conseguem ou desejam fazê-lo. Quem desempenha a função paterna ou a função materna é aquele que gerou uma criança e “adotou-a”. Ou aquele que adotou uma criança e “adotou-a”. São dois atos – e não um. E o segundo é mais difícil, demorado e cheio de percalços.

Que o pai biológico de Luciane se responsabilize ou seja responsabilizado pelo sustento material da filha ninguém discute. Mas não é possível obrigá-lo a ocupar a função paterna no sentido mais amplo e subjetivo. Não há como obrigar ninguém a ser pai ou mãe no sentido pleno. Se o Superior Tribunal de Justiça acredita ter esse poder e, para exercê-lo, bastaria obrigar um pai a pagar um valor em dinheiro, está completamente equivocado.

Todos nós temos de lidar com o que consideramos ausência ou falta de afeto, em várias medidas ao longo da vida. Faz parte da complexidade das relações humanas. E faz parte do humano do nosso tempo acreditar que nunca é amado o suficiente – não só pelos pais, mas pelos filhos, pelos namorados, pelos maridos e pelas esposas, pelos amigos, pelo mundo inteiro.

Temos de lidar com as faltas inerentes a qualquer vida da melhor forma que conseguirmos – e lidar com isso significa crescer. E crescer significa parar de choramingar e seguir adiante. Acho grave que a Justiça considere legítimo cristalizar essa mulher adulta no lugar de vítima e de menina abandonada. E congelar esse homem no lugar de pai ausente e de algoz. A vida é mais complicada do que isso. E um juiz tem o dever de compreender isso. As implicações públicas da decisão do STJ, na minha opinião uma decisão desvairada, ecoarão na vida de todos nós.

Em entrevista à rádio CBN, a ministra Nancy Andrighi afirmou que a decisão do STJ “analisa os sentimentos das pessoas”. Se analisa, ministra, errou. Não cabe ao STJ ou qualquer tribunal analisar “sentimentos” e desferir punições pela ausência ou excesso de “sentimentos”. Isso colocaria os juízes em lugar bastante indevido.

A ministra também disse: “Não se pode negar que tenha havido sofrimento, mágoa e tristeza, e que esses sentimentos ainda persistam, por ser considerada filha de segunda classe". Alguém conhece uma vida ou mesmo uma relação entre pais e filhos que não tenha sofrimento, mágoa ou tristeza mútuas? Como é que uma juíza pode comprar a versão de filha de “segunda classe” de uma forma tão barata?

A ministra ainda disse mais: "Todo esse contexto resume-se apenas em uma palavra: a humanização da Justiça”. Pelo contrário, me parece que a decisão ignora justamente a complexidade e a ambivalência das relações humanas. E desumaniza, ao compensar afeto com dinheiro – o que também é mais um dado interessantíssimo da nossa época de relações monetarizadas.

Luciane, por sua vez, afirma que não sente “raiva ou mágoa” do pai. Só quer “justiça”. Se colocar o pai no banco dos réus e dizer ao país inteiro que ele é um pai ausente, relatando suas desventuras nos mínimos detalhes, não é uma vingança monumental, eu não sei o que é. Mas que Luciane busque isso, podemos até compreender. Que um tribunal legitime a vingança é que é surpreendente. O que poderíamos estar nos perguntando, neste momento, é: como a gente faz para alertar um juiz por “abandono da razão”?

Na Folha de S. Paulo do último sábado (5/5), há duas fotos de Luciane: uma segurando um retrato dela quando bebê, no colo da mãe; a outra vestida de caipira na escola. São fotos comoventes e também são fotos escolhidas para comover – o que me faz ficar ainda mais aflita por ela. As duas fotos, assim como seu discurso, parecem dizer: “Pai, veja como sou ‘amável’”. Ou: “Brasil, veja como sou ‘amável’. Por que este homem mau não quis me amar?”. Parece que é isso que Luciane foi buscar na Justiça: a comprovação, pelo Estado, de que ela é ‘amável’, o pai é que falha. E continua, tristemente, tentando chamar a atenção do pai.

O problema é que dificilmente Luciane conseguirá seguir adiante, paralisada como parece estar no mesmo lugar simbólico. E mais difícil será agora que o tribunal a acompanha na ilusão de que é possível obrigar um pai a ser pai. Ou obrigar um pai a amá-la. E não há dúvida de que ela sofre muito com tudo isso. Tornar-se adulto, porém, é descobrir que o baralho nunca estará completo, que nem mesmo existe um baralho completo. Temos de jogar com as cartas que temos. E tentar recuperar cartas que jamais existiram, como se elas estivessem apenas perdidas, não nos ajuda a viver melhor. Apenas nos congela em um lugar infantil.

É um caso fascinante pelo que revela sobre o nosso tempo. E há bem mais ainda para se ver nele. Por enquanto, ainda queria lembrar que, às vezes, o melhor que pode acontecer a um filho é que certos pais e mães fiquem bem longe.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Que dó da Channel - Sociedades socialistas cultivam a preguiça, a mediocridade e desestimulam a criatividade e coragem profissional

"Os da esquerda culpam os ricos, os da direita radical culpam os estrangeiros, e nenhum dos dois sabe lidar com a complexidade de um mundo que nada tem de perfeito e que é sempre fruto da velha natureza humana: mentirosa, interesseira e preguiçosa, quando pode. Nada brota onde não há dinheiro. Até minha llhasa apso, mais inteligente do que muita gente que conheço, sabe disso"

Luiz Felipe Pondé, Folha de SP

"Que dó da Chanel!", disse minha filha ao ouvir que o Monsieur Normal (François Hollande, o socialista) ganhou as eleições presidenciais na França. Só vai restar a Chanel fugir para Bélgica.

Caras como ele parecem não entender que se você coloca limites para o retorno financeiro de quem trabalha, a pessoa trabalha menos e fica preguiçosa. Ou foge para onde não roubem seu dinheiro, fruto de anos de trabalho duro.

Basta ver a história. Estes caras deveriam ler a filósofa russa Ayn Rand e seu maravilhoso "A Revolta de Atlas", da editora Sextante. Sociedades socialistas cultivam a preguiça, a mediocridade e desestimulam a criatividade e coragem profissional. Todo mundo vira funcionário público. Rand conheceu na pele o ridículo do sistema socialista soviético, antes de fugir para os Estados Unidos.

Dirá o leitor que exagero. Sim, um pouco, mas em se tratando da esquerda francesa, acostumada à vida mansa do Estado de bem-estar social, a França produtiva deve ficar alerta.

Assim como a Argentina, que nunca saiu da pasmaceira peronista, a França nunca saiu do delírio jacobino da Revolução Francesa.

Os caras não crescem e continuam a não entender que país é como sua casa, quando se gasta mais do que se ganha, a conta não fecha no final do mês e você estoura sua conta no banco.

Engraçado como a França e outros países europeus ocidentais que não passaram por regimes marxistas gostam de brincar de socialista. Brincam como se a catástrofe que foi a experiência marxista no poder não tivesse acontecido.

Acusam muita gente de não ter "consciência histórica", quando eles não têm nenhuma. A começar pelos intelectuais de esquerda, esses mandarins da mentira.

Vejam que os países do leste europeu que foram comunistas não chegam nem perto da baboseira da esquerda. Pergunte a uma tcheca ou russa se ela gostaria de voltar ao comunismo.

Mas, como a França ainda tem dinheiro para gastar, o dinossauro francês ganhou a eleição. Se ele não criar juízo e ficar prometendo o que não pode (como deixar os franceses se aposentarem com menos de 60 anos e com isso piorar a pressão sobre a população mais jovem produtiva que paga a conta da previdência social francesa), na próxima eleição, Marine Le Pen (do Front National, partido de extrema-direita) leva, o que seria outra catástrofe. É isso que ela espera, por isso recusou apoio ao Sarkozy.

Tanto a direita radical quanto a esquerda são contra a sociedade de mercado e não entendem nada de economia. Os da esquerda culpam os ricos, os da direita radical culpam os estrangeiros, e nenhum dos dois sabe lidar com a complexidade de um mundo que nada tem de perfeito e que é sempre fruto da velha natureza humana: mentirosa, interesseira e preguiçosa, quando pode. Nada brota onde não há dinheiro. Até minha llhasa apso, mais inteligente do que muita gente que conheço, sabe disso.

E por falar em Chanel (que para mim significa "mulher bonita"), recentemente tivemos mais uma prova de que a natureza humana é atávica em suas mazelas, sendo a inveja uma das piores.

Já disse várias vezes nesta coluna que as mulheres bonitas são vítimas de perseguição por parte das feias -a velha inveja da beleza.

Em recente pesquisa sobre mercado de trabalho, publicada no caderno "Mercado" desta Folha (13/5), israelenses provaram que mulheres bonitas que colocam suas fotos no CV são constantemente eliminadas, não tendo chance de chegar nem a uma primeira entrevista.

E por quê? O fato é que o RH é comumente dominado pelas mulheres, e estas, aparentemente, temem que mulheres bonitas assumam cargos em suas empresas.

Incrível, não? Depois dizem que são os homens que atrapalham a vida profissional das mulheres bonitas. A verdade parece ser o contrário: se aumenta o número de homens envolvidos no processo decisório, a seleção pode deixar de ser injusta para as mais bonitas.

Já que estamos em época de cotas para minorias oprimidas, proponho cotas para mulheres bonitas nas faculdades, nas empresas e no governo. O mundo respira melhor quando tem mulher bonita por perto. Elas são o pulmão do mundo.

domingo, 20 de maio de 2012

As bodas bárbaras


Querem que suas demandas particularistas sejam tratadas como reparação histórica. (..) Negros, feministas, homossexuais, índios, sem-terra, sem-teto, sem eira nem beira… Todos anseiam que a História seja vivida como culpa, e a desculpa se traduz na concessão de algum privilégio. Isso que já é uma ética coletiva supõe que todos são vítimas de alguém ou de alguma coisa. De quem ou do quê? Ninguém sabe. “Da sociedade” talvez. 


Por Reinaldo Azevedo

O marxismo é uma variante da preguiça. Se você acredita que a base material condiciona mudanças na cultura, na forma de pensar e nas relações intersubjetivas, basta fazer como os romanos do poema “À Espera dos Bárbaros”, de Kafávis: sentar na calçada e esperar a banda passar. E há os que resolveram acelerar a história para que o inexorável chegasse antes: Lênin, Stálin, Mao, Pol Pot. O resultado se mede em crânios.

O truque da chamada Escola de Frankfurt — de que Habermas é caudatário, embora infinitamente mais chato porque escreve mal — já é mais divertido do que o marxismo clássico. O que em um é consequência vira, no outro, causa, e a cultura é vista como o motor das mudanças materiais. É uma bobagem que alimenta intelectuais cuja profissão é contestar o regime — que lhes garante a liberdade de contestação. Mas muito influente.

O velho marxismo morreu de falência múltipla dos órgãos. A sua realização prática eram as economias planificadas, que não resistiram à globalização — descrita ou antevista, como queiram, pelo próprio Marx no “Manifesto Comunista”. Já ali se podia supor que o socialismo buscava represar o mar. O neomarxismo pretendeu fazer a crítica à ortodoxia esquerdista sem ceder à razão burguesa. Deu em quê?

Da maçaroca de esquerdismos não-dogmáticos nasceu uma vulgata virulenta: o pensamento politicamente correto. Tanto se dedicaram os intelectuais da dita nova esquerda à desconstrução do suposto eixo autoritário das democracias burguesas que a política militante degenerou, nos países ricos, no que Robert Hughes chama de “cultura da reclamação” e, nos pobres, de “excluídos militantes”, que rejeitam os valores universais da igualdade e o Estado de Direito. Querem que suas demandas particularistas sejam tratadas como reparação histórica.

Negros, feministas, homossexuais, índios, sem-terra, sem-teto, sem eira nem beira… Todos anseiam que a História seja vivida como culpa, e a desculpa se traduz na concessão de algum privilégio. Isso que já é uma ética coletiva supõe que todos são vítimas de alguém ou de alguma coisa. De quem ou do quê? Ninguém sabe. “Da sociedade” talvez. A hipótese é interessante. Poderíamos zerar a História, dissolver os contratos e voltar ao estado da natureza. O Brasil já tem um novo “negro” ou um novo “índio”: é o macho branco, pobre, heterossexual e católico. É um pobre coitado, um discriminado, um sem-ONG. Nem os padres querem saber dele.

As “minorias” se profissionalizam, e a luta sempre continua. Não temos uma política pública digna desse nome que se ocupe, por exemplo, da qualidade do ensino fundamental e médio, mas se faz, com cotas e ProUni, suposta justiça social na universidade, onde o único critério cabível de seleção é o saber — que mascararia as diferenças de classe e traria consigo um contencioso de injustiças históricas. Eis o desastre: competência e justiça, nesse raciocínio perturbado, passam a se opor, viram uma disjuntiva. Nas TVs, e até nos cadernos de cultura dos jornais, “manos” do rap e “MCs” fazem-se porta-vozes de uma nova metafísica, oposta àquele saber universal, formalista e reacionário. Padre Pinto é o santo padroeiro dessa guerra à ortodoxia.

Igualdade? Justiça? Reparação? Nada disso. Consolida-se é o divórcio entre os partidários desse igualitarismo — que, de fato, é um particularismo que corrói as bases do Estado de Direito — e os da universalidade. O “novo homem” do antigo marxismo — que era, sim, uma utopia liberticida e homicida — foi substituído pelos bárbaros, cujo mundo ideal é aquele disputado por hordas, tribos, bandos, de que entidades do “terceiro setor” são proxenetas bem remuneradas.

Os tais mercados não dão a menor bola para isso. A plateia que vi mais incomodada e, até certo ponto, indignada com a crítica severa que faço ao PT e a seu viés totalitário era composta de pessoas ligadas ao mercado financeiro. A democracia, como a defendiam os antigos liberais, é a eles irrelevante. Trata-se de dinheiro novo. Assistimos ao casamento entre os hunos e essa gente muito prática. As bodas bárbaras.

República destroçada


O prazo de validade de uma aliança política, de um projeto de governo, é sempre muito curto. O aliado de hoje é facilmente transformado no adversário de amanhã, tudo porque o que os unia era meramente o espólio do poder.

Marco Antonio Villa, O Estado de S. Paulo, 30/10/11
Em 1899 um velho militante, desiludido com os rumos do regime, escreveu que a República não tinha sido proclamada naquele mesmo ano, mas somente anunciada. Dez anos depois continuava aguardando a materialização do seu sonho. Era um otimista. Mais de cem anos depois, o que temos é uma República em frangalhos, destroçada.
Constituições, códigos, leis, decretos, um emaranhado legal caótico. Mas nada consegue regular o bom funcionamento da democracia brasileira. Ética, moralidade, competência, eficiência, compromisso público simplesmente desapareceram. Temos um amontoado de políticos vorazes, saqueadores do erário. A impunidade acabou transformando alguns deles em referências morais, por mais estranho que pareça. Um conhecido político, símbolo da corrupção, do roubo de dinheiro público, do desvio de milhões e milhões de reais, chegou a comemorar recentemente, com muita pompa, o seu aniversário cercado pelas mais altas autoridades da República.
Vivemos uma época do vale-tudo. Desapareceram os homens públicos. Foram substituídos pelos políticos profissionais. Todos querem enriquecer a qualquer preço. E rapidamente. Não importam os meios. Garantidos pela impunidade, sabem que se forem apanhados têm sempre uma banca de advogados, regiamente pagos, para livrá-los de alguma condenação.
São anos marcados pela hipocrisia. Não há mais ideologia. Longe disso. A disputa política é pelo poder, que tudo pode e no qual nada é proibido. Pois os poderosos exercem o controle do Estado - controle no sentido mais amplo e autocrático possível. Feio não é violar a lei, mas perder uma eleição, estar distante do governo.
O Brasil de hoje é uma sociedade invertebrada. Amorfa, passiva, sem capacidade de reação, por mínima que seja. Não há mais distinção. O panorama político foi ficando cinzento, dificultando identificar as diferenças. Partidos, ações administrativas, programas partidários são meras fantasias, sem significados e facilmente substituíveis. O prazo de validade de uma aliança política, de um projeto de governo, é sempre muito curto. O aliado de hoje é facilmente transformado no adversário de amanhã, tudo porque o que os unia era meramente o espólio do poder.
Neste universo sombrio, somente os áulicos - e são tantos - é que podem estar satisfeitos. São os modernos bobos da corte. Devem sempre alegrar e divertir os poderosos, ser servis, educados e gentis. E não é de bom tom dizer que o rei está nu. Sobrevivem sempre elogiando e encontrando qualidades onde só há o vazio.
Mas a realidade acaba se impondo. Nenhum dos três Poderes consegue funcionar com um mínimo de eficiência. E republicanismo. Todos estão marcados pelo filhotismo, pela corrupção e incompetência. E nas três esferas: municipal, estadual e federal. O País conseguiu desmoralizar até novidades como as formas alternativas de trabalho social, as organizações não governamentais (ONGs). E mais: os Tribunais de Contas, que deveriam vigiar a aplicação do dinheiro público, são instrumentos de corrupção. E não faltam exemplos nos Estados, até mesmo nos mais importantes. A lista dos desmazelos é enorme e faltariam linhas e mais linhas para descrevê-los.
A política nacional tem a seriedade das chanchadas da Atlântida. Com a diferença de que ninguém tem o talento de um Oscarito ou de um Grande Otelo. Os nossos políticos, em sua maioria, são canastrões, representam mal, muito mal, o papel de estadistas. Seriam, no máximo, meros figurantes em Nem Sansão nem Dalila. Grande parte deles não tem ideias próprias. Porém se acham em alta conta.
Um deles anunciou, com muita antecedência, que faria um importante pronunciamento no Senado. Seria o seu primeiro discurso. Pelo apresentado, é bom que seja o último. Deu a entender que era uma espécie de Winston Churchill das montanhas. Não era, nunca foi. Estava mais para ator de comédia pastelão. Agora prometeu ficar em silêncio. Fez bem, é mais prudente. Como diziam os antigos, quem não tem nada a dizer deve ficar calado.
Resta rir. Quem acompanha pela televisão as sessões do Congresso Nacional, do Supremo Tribunal Federal (STF) e as entrevistas dos membros do Poder Executivo sabe o que estou dizendo. O quadro é desolador. Alguns mal sabem falar. É difícil - muito difícil mesmo, sem exagero - entender do que estão tratando. Em certos momentos parecem fazer parte de alguma sociedade secreta, pois nós - pobres cidadãos - temos dificuldade de compreender algumas decisões. Mas não se esquecem do ritualismo. Se não há seriedade no trato dos assuntos públicos, eles tentam manter as aparências, mesmo que nada republicanas. O STF tem funcionários somente para colocar as capas nos ministros (são chamados de “capinhas”) e outros para puxar a cadeira, nas sessões públicas, quando alguma excelência tem de se sentar para trabalhar.
Vivemos numa República bufa. A constatação não é feita com satisfação, muito pelo contrário. Basta ler o Estadão todo santo dia. As notícias são desesperadoras. A falta de compostura virou grife. Com o perdão da expressão, mas parece que quanto mais canalha, melhor. Os corruptos já não ficam envergonhados. Buscam até justificativa histórica para privilégios. O leitor deve se lembrar do símbolo maior da oligarquia nacional - e que exerce o domínio absoluto do seu Estado, uma verdadeira capitania familiar - proclamando aos quatro ventos seu “direito” de se deslocar em veículos aéreos mesmo em atividade privada.
Certa vez, Gregório de Matos Guerra iniciou um poema com o conhecido “Triste Bahia”. Bem, como ninguém lê mais o Boca do Inferno, posso escrever (como se fosse meu): triste Brasil. Pouco depois, o grande poeta baiano continuou: “Pobre te vejo a ti”. É a melhor síntese do nosso país. 
HISTORIADOR, É PROFESSOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS(UFSCAR)

sábado, 19 de maio de 2012

Brasil cabeção - O que as crianças miseráveis do Brasil precisam, do Estado, é menos amor e mais confiança.

Dia desses, escrevi, mas não enviei, um longo e-mail para jornalista Claudia Laitano criticando um texto que ela além de ser a favor da cotas raciais (obvio que isso não era o problema) argumentava que algo estava errado quando na universidade federal muitas pessoas que teriam dinheiro pra pagar uma universidade privada estariam entrando.

Pensei na época: Quer dizer então que a classe média está fadada a só pagar e não receber nada, nunca? Pagamos tudo em dobro (impostos + educação, segurança e saúde privada) e não podemos ter a contrapartida nem na universidade pública, onde a entrada era até pouco tempo atras, antes das cotas raciais, puramente no mérito?

Não mandei o e-mail, mas fiquei um tanto espantando com esse pensamento que eu sei que muita gente tem, infelizmente.

No entanto, como costumo pensar com minha própria cabeça, e portanto, discordo ou concordo de ideias e não de pessoas, reproduzo abaixo um excelente texto dessa jornalista.


Brasil cabeção

Claudia Laitano (ZH 19.5)
Se os japoneses batizassem um programa de governo de Japão Disciplinado ou os Estados Unidos criassem uma campanha chamada América pelo Consumismo, ia soar como se uma febre pleonástica tivesse acometido o Primeiro Mundo. Foi mais ou menos essa a sensação que eu tive ao ouvir o nome do novo programa de combate à miséria do governo federal: Brasil Carinhoso.

Coração é o que não nos falta, a gente sabe. Nos anos 30, o sociólogo Sérgio Buarque de Holanda (o sogro dos sonhos de nove entre 10 brasileiras) cunhou uma expressão que até hoje é mal entendida e mal citada. Seu “homem cordial” não é o sujeito bonzinho que sempre tem uma palavra gentil na ponta da língua e ajuda velhinhas a atravessar a rua. A cordialidade brasileira que o sociólogo descreve não é a do bom coração e da hospitalidade, mas a do domínio da emoção sobre a razão, que pode causar tanto as efusões amorosas mais comoventes quanto as reações mais violentas e intempestivas – não por acaso, esse país tão cheio de amor para dar é também campeão nas estatísticas de violência contra a mulher. O homem cordial clássico, de catálogo, é aquele que odeia formalidades, mesmo quando elas são criadas para organizar a vida de todo mundo, e ignora regras de ética e civilidade quando elas não lhe parecem 100% convenientes. Alguém aí reconheceu um brasileiro?

Quando um país com um largo histórico de populismo usa a palavra “carinhoso” em um programa de governo, arrepiam-se os pelos das nucas mais paranoicas. Não existe palavra tão doce na língua portuguesa quanto essa que dá nome a uma das mais belas canções da música popular brasileira, mas uma política que se autodenomina “carinhosa”, ainda que coberta de méritos, sempre parece firmar-se no terreno flácido das boas intenções e do paternalismo e não na arena sólida das instituições que têm continuidade e metas objetivas para além dos governos e dos políticos. Carinho a gente dá e a gente tira. É uma concessão, não um direito ou um dever.

Se o Brasil fosse levar a sério mesmo esse negócio de slogans motivacionais deveria criar programas com nomes como “Brasil Racional”, “Brasil Cumpridor de Prazos”, “Brasil: começo, meio e fim”. Claro que não ia adiantar nada, como em geral não servem para nada slogans motivacionais postados no Facebook ou na porta da geladeira, mas talvez fosse mais útil reconhecer o que nos falta do que celebrar o que sempre tivemos de sobra. Realmente surpreendente seria se os estudantes brasileiros fossem brindados com um programa de educação tão sério e eficiente que algum gaiato resolvesse apelidar de “Brasil cabeção” .

Carinho, elas querem é da família. O que as crianças miseráveis do Brasil precisam, do Estado, é menos amor e mais confiança.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Do contra (David Coimbra)


Sou mais contra ainda a política dos governos do Estado e do país para a Educação. Não há investimento na Educação primária, nem coragem para enfrentar os problemas. Os governos investem nas universidades porque é mais fácil. O nó está lá embaixo, na escola fundamental, mas agir nessa área dá muito trabalho.


Sou contra a EPTC. A EPTC podia fechar e passar todo o trabalho e os recursos dele decorrentes para a Brigada. Se o controle do trânsito voltasse a ser da BM, a segurança teria mais verbas e haveria mais policiais nas ruas. Os azuizinhos não perderiam emprego, passariam a ser brigadianos e tudo ficaria bem. Então, sou muito contra a EPTC.

Também sou contra o voto obrigatório. Se algum dia educou, o fato de o voto ser compulsório não educa mais; só enche o saco do eleitor. Diminui a qualidade do voto, ao invés de aumentá-la. Você lembra em qual !@#@!$#%¨%$#! candidato você votou na última eleição? Não lembra porque o !@#@!$#%¨%$#! do voto é obrigatório. Se não fosse, você votaria com mais gosto e critério.

Sou contra a política do Cpers. Os 30 anos de greves não melhoraram a situação dos professores, nem da Educação. Ambos, professores e Educação, vivem um tempo de tragédia, e uma das causas disso é a tática de enfrentamento do Cpers.

Sou mais contra ainda a política dos governos do Estado e do país para a Educação. Não há investimento na Educação primária, nem coragem para enfrentar os problemas. Os governos investem nas universidades porque é mais fácil. O nó está lá embaixo, na escola fundamental, mas agir nessa área dá muito trabalho.

Sou contra as cotas raciais nas universidades. Se o Estado quer corrigir distorções antigas, basta fornecer cotas para as escolas públicas. Negros, índios, mamelucos, japoneses, alemães, iugoslavos, pobres em geral estudam em escolas públicas. Um negro rico pode estudar toda a vida em escola particular e se beneficiar com a cota racial. A cota racial é bem-intencionada, mas gera ainda mais preconceito e discriminação. Sou totalmente contra.

Sou contra manifestações de ciclistas que infringem as leis de trânsito, contra manifestações de sem-qualquer-coisa que invadem prédios públicos, contra quem invade praças, contra quem fecha ruas ou estradas. Manifestações desse tipo são CONTRAproducentes, porque só aporrinham a população, que também tem lá as suas queixas e só quer viver a vida em paz.

Sou contra pitbulls. Você não pode criar um leopardo ou um leão em casa, porque eles são feras, põem em risco a comunidade. O pitbull também é uma fera, além de ser um cachorro muito feio. Mas não é preciso eliminar os pitbulls, “matar tudo”, como defendem alguns. Não. Basta esterilizá-los e a espécie se extinguirá de forma lenta e indolor.

Sou contra a palmada educativa. Uma criança pode ser educada muito bem sem castigo físico. Palmada é reação de pais preguiçosos.

Sou contra a lei que proíbe a palmada educativa. O Estado não tem de se intrometer na intimidade familiar. Se os pais estiverem maltratando a criança, já existem leis para defendê-las.

Sou contra a mistura de álcool com direção, contra a venda de álcool nas proximidades das estradas, contra a venda de álcool para menores de idade.

Sou contra o limite zero de consumo de álcool para motoristas na cidade. Na estrada, o motorista não poderia nem enxaguar a boca com Listerine; na cidade, há que se ter um limite de bom senso, para não se incorrer em injustiças.

Sou contra, mais do que tudo, a intolerância. Sou intolerantemente contra a intolerância. A tolerância é a virtude que nos torna humanos. Por isso, basta ponderar, e muitas vezes me torno a favor de coisas de que sou contra.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Série especial: as vozes que se opõem aos irmãos Castro em Cuba

E a turma do governo popular por aqui ainda sonha com esse modelo.

Nossa escola não é feita para dar certo

Por Gustavo Ioschpe da Revista VEJA


Imagine que você trabalha em uma empresa em que os funcionários não ganham de acordo com sua competência, mas sim segundo seu tempo de casa e nível de estudo. Não há promoções, mas também só há demissão em casos de violação grotesca. Mesmo faltando repetidamente ao serviço, não alcançando sua meta ano após ano e maltratando seu cliente, você continua no posto até se aposentar. Imagine que não exista, em sua região, universidade que prepare bem para o seu emprego, de forma que você já chega ao trabalho não sabendo muito. Pior: tem gente que trabalha em área diferente daquela em que foi formada; o cara de vendas se formou em letras. Imagine que essa empresa só tenha dois cargos (funcionário e chefe) e que quase metade dos chefes tenha chegado ao cargo por indicação de um conhecido dos donos (o restante é majoritariamente eleito para a posição pelos funcionários). Imagine que os donos são muitos, que eles não costumam freqüentar a empresa e que a herdaram como parte de um conglomerado, do qual a sua empresa é uma das que agregam menos valor aos donos. Imagine agora que o serviço prestado pela sua empresa é complexo e dirigido a crianças e jovens. Imagine também que essas crianças e seus pais não saibam julgar a qualidade do serviço, mas achem que está tudo bem, desde que você o empacote em uma embalagem bonita e dê aos clientes alguns brindes (uns livros, umas roupas, de repente até um laptop aos mais sortudos). A empresa consegue dar todos esses brindes; a maioria dos clientes está, portanto, satisfeita. Imagine que os clientes e seus familiares não precisem pagar diretamente pelo serviço; o pagamento vem da empresa-mãe (a que congrega todos os negócios do grupo) e é baseado na compra de outros produtos e serviços oferecidos por outras empresas do grupo.


Agora pense nesse ambiente de trabalho e responda às seguintes perguntas. Se você trabalhasse nele, estaria motivado a dar o seu melhor ou pegaria leve, esperando o contracheque no fim do mês? Como você acha que seus outros colegas de empresa se comportariam? Se lhe dessem um aumento salarial, você se esforçaria mais? Se você fosse uma pessoa carreirista, permaneceria nessa empresa? Aliás, você teria entrado nela? No caso dos chefes indicados pelos amigos dos donos, você acha que eles estariam mais preocupados em agradar aos clientes ou aos donos e seus amigos? No caso dos chefes eleitos por você e seus colegas, acha que elescomprariam briga com você para defender os interesses dos clientes ou virariam seus aliados? Presumindo que os clientes permanecessem satisfeitos e que continuassem pagando indiretamente pelo serviço, você acha que os donos se interessariam em reformar a empresa para que ela servisse melhor sua clientela, desse mais resultados? Ou será que suas prioridades seriam manter a coisa no estado em que se encontra e devotar suas energias para os outros braços do conglomerado, os que dão mais retomo?

Não sei qual o grau de sua fé na humanidade nem suas crenças na natureza humana, mas eu tendo a achar que a empresa acima seria uma balbúrdia, com profissionais desmotivados e trabalhando abaixo de sua capacidade, clientes mal atendidos, conchavos entre funcionários e chefes, donos desinteressados e pouco envolvidos. Eu acho que melhorar o salário dos funcionários não mudaria o problema. Vou além: enquanto essa estrutura de incentivos não fosse alterada, qualquer investimento numa empresa assim seria um desperdício de tempo e dinheiro. Aliás, não é uma opinião, até porque esse cenário não é hipotético nem trata de empresas. O quadro descrito retrata a maioria das escolas públicas brasileiras. Os funcionários são os professores, os chefes são os diretores de escola, os donos são a classe política, os clientes são os alunos. O resto não carece de alterações para chegar à realidade.

Aposto que você sabe que nossa educação é péssima e que esse problema é fatal para nossas possibilidades de desenvolvimento. Aposto também que você acha que esse problema não o afeta, especialmente se você põe seu filho em escola particular. Aposto que gasta mais tempo na seção de esportes do seu jornal do que naquela que cuida de educação. Se é que o seu jornal tem uma seção devotada ao assunto, já que 90% da cobertura do tema se limita a notícias sobre greves, ameaças de greve e outras reclamações salariais. E, até porque o assunto é apenas esse — dinheiro —, você acha (acha não: você tem certeza, depois de vinte ou trinta anos de leituras sobre o assunto) que o principal problema da educação brasileira é. o salário dos professores. Aposto também que, dois parágrafos antes, você respondeu que aumentar o salário dos funcionários não resolveria nada, e aposto também que você gosta dos brindes (se você for mais pobre, merenda; se mais rico, lousa eletrônica ou currículo bilíngüe) que a escola do seu filho dá.

Antes que os patrulheiros se arvorem, não estou querendo comparar a escola a uma empresa. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Apenas propus um exercício mental. O que espero que esse exercício tenha deixado claro é o seguinte: não é que a educação brasileira fracassa misteriosamente apesar dos melhores esforços de todos os envolvidos. Ela fracassa porque esse arranjo institucional requer a irracionalidade de todos os envolvidos, do prefeito ao professor. Nossa escola não é feita para dar certo — se por “dar certo” entendermos a formação de uma pessoa com as habilidades mínimas para navegar o mundo e desenvolver seu potencial.

Não faz sentido para um professor brasileiro comprar a briga: com má formação, precisaria de um esforço hercúleo para obter grandes resultados. Mas esses resultados não lhe trariam reconhecimento, promoções, prêmios ou aumentos. Não faz sentido para o aluno brasileiro se esforçar: a aula que ele recebe é extremamente chata, a maioria dos professores não está muito preocupada com o seu aprendizado, e ele sabe que, se fizer um esforço mínimo, vai continuar sendo aprovado, mesmo sem aprender bulhufas. Não faz sentido para o diretor de escola se insurgir contra essa situação e querer mudar radicalmente o status quo. Se a sua nomeação depende de eleição dos professores, ele não vai querer exigir de seus eleitores mais trabalho e dedicação, até por não ter nada a lhes oferecer em troca. Se o diretor tiver indicação política, então, Deus o livre de qualquer incômodo: o importante é dar vida fácil a todos, carregar nos "brindes” e deixar os eleitores do seu padrinho político felizes. Não faz sentido para os pais dos alunos protestar contra o atual estado de coisas, porque a maioria deles está satisfeita com a educação que o filho recebe (em pesquisa recente do Inep, a nota média dada pelos pais de alunos da escola pública à qualidade da educação do filho foi 8,6!). E a maioria está satisfeita porque não tem condições intelectuais de avaliar o que é uma boa educação, pois é semiletrada, e nem sabe que existem avaliações oficiais sobre a qualidade do ensino do filho. Finalmente, não faz sentido para d político trabalhar para melhorar a qualidade do ensino: não há pressão por pane de alunos nem de seus pais, e há uma enorme resistência a qualquer mudança por parte dos sindicatos de professores e funcionários. Politicamente, só há custos, sem benefícios. Nenhum político racional mexe nesse vespeiro.

Há, é claro, as exceções. O professor apaixonado pelo que faz, que dá duro independentemente do salário, da carreira desanimadora, dos alunos desmotivados e dos colegas que o pressionam para se aquietar. O diretor comprometido, que se orgulha de fazer uma grande escola e seleciona profissionais que comprem essa batalha. Os alunos e seus pais que querem melhorar de vida e sabem que precisam de educação de qualidade, que lutam contra a pasmaceira. E os políticos comprometidos com a próxima geração, e não com a próxima eleição. Mas esses são minoria, e o sistema está contra eles. Enquanto a lógica do sistema não for alterada, todas as ações pontuais para melhorá-lo — da lousa eletrônica ao salário mais alto — provavelmente irão para o ralo. Acredito que o quadro só mudará quando a população passar a ver a educação brasileira como ela realmente é. Somente aí poderemos esperar a pressão popular por uma educação de qualidade, que gerará incentivo para que políticos cobrem desempenho dos funcionários do sistema. Ou seja, o problema é seu. Está esperando o que para fazer alguma coisa?

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Cadeia nacional para a mãe do PAC

É muito melhor fazer comício contra juros altos (“peitar os bancos!”) do que organizar as finanças públicas, acabar com a farra tributária, abrir mão do fisiologismo, parar de gastar o dinheiro que não tem e controlar toda essa bagunça institucional que empurra para o alto a inflação – e os juros.


Enquanto Dilma Rousseff se especializa em falar sozinha na TV, o presidente do PT avisa que o governo popular vai “peitar” a mídia. É compreensível.
A mídia é praticamente o único problema do Brasil atualmente. Se não fosse ela, não existiria corrupção no governo popular (o que os olhos não vêem, o coração não sente).


Infelizmente, a rede parasitária montada pelos companheiros em pelo menos sete ministérios foi parar nas manchetes. Não fosse essa invasão de privacidade, esquemas como o do Dnit com a Delta continuariam firmes na aceleração do crescimento.

Se não fosse a mídia para atrapalhar, o governo da presidenta falaria diretamente com o povo – sem esses assuntos azedos que só interessam à imprensa.

E já que jornalista só gosta de coisa ruim, o PT resolveu falar sozinho, em
 cadeia obrigatória de rádio e TV.

Dia da Mulher, Dia do Trabalhador, Dia das Mães e todas as datas simpáticas do calendário passaram a ser, também, Dia da Dilma. São os momentos em que a presidenta olha nos olhos do Brasil e diz a ele só coisas lindas, de arrepiar.

O comício contra os bancos no Primeiro de Maio foi inesquecível. Como governar é muito chato e trabalhoso, o PT resolveu voltar a ser estilingue (sem sair do palácio).

É o primeiro governo de oposição da história.

É muito melhor fazer comício contra juros altos (“peitar os bancos!”) do que organizar as finanças públicas, acabar com a farra tributária, abrir mão do fisiologismo, parar de gastar o dinheiro que não tem e controlar toda essa bagunça institucional que empurra para o alto a inflação – e os juros.

O povo está adorando esse governo de oposição, liderado por uma mulher corajosa que faz faxina em sua própria lambança e vira heroína.

No pronunciamento emocionante do Dia das Mães, que lançou o programa Brasil Carinhoso, só faltou uma palavra de carinho para a construtora Delta, que cresceu e engordou sob a guarda da Mãe do PAC.

Foi dentro do projeto de peitar a mídia que Lula insuflou a CPI do Cachoeira. A idéia era mostrar que a imprensa burguesa também estava no bolso do bicheiro e que o mensalão não existiu.

Quem sabe essas pérolas do romantismo petista não viram verdade no Dia dos Namorados, em mais um pronunciamento oficial da presidenta?

Fonte: Guilherme Fiuza (Revista Época)

Só os mentirosos, do passado e do presente, negam que sejamos responsáveis por nossas escolhas.

Os psicólogos sociais deveriam ler mais Shakespeare e menos estas cartilhas fanáticas que dizem que o "ser humano é uma construção social", e não um ser livre responsável por suas escolhas, já que seriam vítimas sociais. (..) A teoria da construção do sujeito como vítimas sociais faz das pessoas preguiçosas, perversas e mentirosas sobre a motivação de seus atos. 


Texto maravilhoso, genial!
Tenho uma coisa a acrescentar apenas. Se você acredita que fizemos escolhas, independente do estado social, cor, sexo ou sexualidade, então você não pode ser de esquerda. Simples assim!


A traição da psicologia social

Luiz Felipe Pondé, Folha de SP

Olha que pérola para começar sua semana: "Esta é a grande tolice do mundo, a de que quando vai mal nossa fortuna -muitas vezes como resultado de nosso próprio comportamento-, culpamos pelos nossos desastres o Sol, a Luz e as estrelas, como se fôssemos vilões por fatalidade, tolos por compulsão celeste, safados, ladrões e traidores por predominância das esferas, bêbados, mentirosos e adúlteros por obediência forçada a influências planetárias". William Shakespeare, "Rei Lear", ato 1, cena 2 (tradução de Barbara Heliodora).

Os psicólogos sociais deveriam ler mais Shakespeare e menos estas cartilhas fanáticas que dizem que o "ser humano é uma construção social", e não um ser livre responsável por suas escolhas, já que seriam vítimas sociais. Os fanáticos culpam a sociedade, assim como na época de Shakespeare os mentirosos culpavam o Sol e a Lua.

Não quero dizer que não sejamos influenciados pela sociedade, assim como somos pelo peso de nossos corpos, mas a liberdade nunca se deu no vácuo de limites sociais, biológicos e psíquicos. Só os mentirosos, do passado e do presente, negam que sejamos responsáveis por nossas escolhas.

Mas antes, um pouco de contexto para você entender o que eu quero dizer.

Outro dia, dois sujeitos tentaram assaltar a padaria da esquina da minha casa. Um dos donos pegou um dos bandidos. Dei parabéns para ele. Mas há quem discorde. Muita gente acha que ladrão que rouba mulheres e homens indo para o trabalho rouba porque é vítima social. Tadinho dele...

Isso é papo-furado, mas alguns acham que esse papo-furado é ciência, mais exatamente, psicologia social. Nada tenho contra a psicologia, ao contrário, ela é um dos meus amores -ao lado da filosofia, da literatura e do cinema. Mas a psicologia social, contra quem nada tenho a priori, às vezes exagera na dose.

O primeiro exagero é o modo como a psicologia social tenta ser a única a dizer a verdade sobre o ser humano, contaminando os alunos. Afora os órgãos de classe. Claro, a psicologia social feita desta forma é pura patrulha ideológica do tipo: "Você acredita no Foucault? Não?! Fogueira para você!".

Mas até aí, este pecado de fazer bullying com quem discorda de você é uma prática comum na universidade (principalmente por parte daqueles que se julgam do lado do "bem"), não é um pecado único do clero fanático desta forma de psicologia social. Digo "desta forma" porque existem outras formas mais interessantes e pretendo fazer indicação de uma delas abaixo.

Sumariamente, a forma de psicologia social da qual discordo é a seguinte: o sujeito é "construído" socialmente, logo, quem faz besteira ou erra na vida (comete crimes ou é infeliz e incapaz) o faz porque é vítima social. Se prestar atenção na citação acima, verá que esta "construção social do sujeito" está exatamente no lugar do que Shakespeare diz quando se refere às "esferas celestes" como responsáveis por nossos atos.

Antes, eram as esferas celestes, agora, são as esferas sociais as culpadas por roubarmos os outros, ou não trabalharmos ou sermos infelizes. Se eu roubo você, você é que é culpado, e não eu, coitado de mim, sua real vítima. Teorias como estas deveriam ser jogadas na lata de lixo, se não pela falsidade delas, pelo menos pelo seu ridículo.

Todos (principalmente os profissionais da área) deveriam ler Theodore Dalrymple e seu magnífico "Life at The Bottom, The Worldview that Makes the Underclass", editora Ivan R. Dee, Chicago (a vida de baixo, a visão de mundo da classe baixa), em vez do blá-blá-blá de sempre de que somos construídos socialmente e, portanto, não responsáveis por nossos atos.

Dalrymple, psiquiatra inglês que atuou por décadas em hospitais dos bairros miseráveis de Londres e na África, descreve como a teoria da construção do sujeito como vítimas sociais faz das pessoas preguiçosas, perversas e mentirosas sobre a motivação de seus atos. Lendo-o, vemos que existe vida inteligente entre aqueles que atuam em psicologia social, para além da vitimização social que faz de nós todos uns retardados morais.